São Paulo, sábado, 02 de julho de 2011

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Fishlow defende corte de gastos de verdade

Professor emérito da Universidade Columbia diz que país não conseguirá crescer e conter a inflação ao mesmo tempo

Fishlow diz que a taxa de juros é insuficiente para alcançar os dois objetivos e sugere aperto na Previdência

MARIANA CARNEIRO
DE SÃO PAULO

Debelar a inflação e manter o crescimento são desejos inconciliáveis, diz Albert Fishlow, 75, professor emérito da Universidade Columbia e da Universidade Berkeley, que estuda o Brasil há mais de 40 anos: "Não funciona".
A resposta para sair desse dilema é o corte "verdadeiro" das despesas do governo. À Folha Fishlow decretou a obsolescência do superavit primário e diz que só o reordenamento dos gastos do país levará o Brasil a taxas de crescimento mais elevadas.

Folha - É possível combater a inflação e manter o crescimento da economia?
Albert Fishlow - Quando se tem dois objetivos na economia e apenas um instrumento, não funciona. São necessários dois instrumentos. O instrumento principal -utilizado há muitos anos- é a política monetária [ajuste da taxa de juros]. O que está faltando é a política fiscal. Foi por causa disso que a presidente Dilma anunciou no início do ano uma redução de despesas. Mas o corte vem depois de um aumento dos gastos no ano passado.


Mas o governo não está fazendo superavit primário?
Superavit primário não é um superavit real. É um esforço que não considera as despesas com juros. Se o Brasil está interessado em ter uma taxa de juros mais baixa, tem que reduzir os gastos governamentais, criar um superavit ou ao menos eliminar o deficit fiscal [tudo que é gasto além da arrecadação]. Não há razão para o Brasil, com os preços de commodities altos, não ter superavit fiscal. O Chile, que produz cobre, tem superavit.


Então não adianta fazer superavit primário?
Foi uma boa ideia no início. Mas hoje cria erros, porque tem gente no país que acha que há superavit, quando na verdade o que se tem é um deficit de cerca de 2,5% do Produto Interno Bruto.


Se não é possível alcançar crescimento e combater a inflação ao mesmo tempo, o que o governo deve priorizar?
Neste momento, a redução da inflação. Senão o crescimento futuro vai ser menor: o governo terá de aumentar ainda mais os juros, vai ter que mexer ainda mais na taxa de câmbio e vai ter que limitar mais ainda os investimentos em infraestrutura.


O governo aposta em medidas para conter o crédito para ajudar a controlar a inflação sem abater o crescimento.
Pode ter impacto, mas não vai ser suficiente para evitar uma ação maior na área fiscal. E, veja bem, quando falamos de uma diferença entre o crescimento produzido com a política que estou descrevendo e o da política atual, não falo de algo grande.


De quanto?
Estamos falando de 3,5% de crescimento em vez dos 4,5% que o ministro Guido Mantega está prevendo. Temos outro problema, que é a falta de investimento dentro do país. O país não tem como crescer sem aumentar o investimento para tratar problemas de infraestrutura.


O sr. defende o sacrifício de parte do crescimento agora?
É um dilema. O fato é que vai haver uma taxa [de crescimento] maior fazendo as políticas necessárias agora do que postergar para ver o que poderá acontecer.


Por que o Brasil tem juros mais elevados que países com situação fiscal pior?
Está ligado à possibilidade de o país não continuar as políticas de longo prazo, com a tentação de gastar mais. Como consequência, o país ficou com taxa de juros alta. Com uma política em que o esforço fiscal entra como elemento forte, os juros no país ficam iguais aos dos outros.


Que gastos devem ser preferencialmente observados?
O deficit na Previdência. O governo precisa reduzir o volume de dinheiro que está gastando. O principal é a correção automática das aposentadorias com o salário mínimo. Isso vai criar problemas no ano que vem, porque vai haver um aumento superior a 12% do salário mínimo.


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