São Paulo, domingo, 03 de outubro de 2010

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JANIO DE FREITAS

Enfim, logo mais



Nenhuma campanha para a Presidência proporcionou faixa tão estreita de temas para os comentaristas

CHEGOU, UFF. Sem exclamação no uff? Nem poderia. Nenhuma campanha para a Presidência proporcionou faixa tão estreita de assuntos para a maioria dos comentaristas na imprensa. As estrelas da campanha, as que nela suscitaram atenções e algum tipo de sentimento em leitores/eleitores, foram o Supremo Tribunal Federal e um sortimento admirável de parentes -filha de Serra, marido e filho e tio e primo do filho de Erenice, genro do ministro Ayres Britto, mulher de Roriz, e ainda não acabou.
É impossível não reconhecer que o STF fez o que não podia para dar a estas eleições um lugar histórico. Já está mais do que citada a originalidade de uma eleição cujo resultado, em grande parte, não definirá êxito nem derrota de numerosos candidatos a governos estaduais, Senado e Câmara. Algum dia, não há previsão razoável, o eleitorado vai saber quem daquele contingente foi eleito, e até será possível ao Senado, à Câmara e aos partidos fazerem sua quase ociosa composição dos dois plenários. Por certo haverá processos e recursos a se estenderem por muito tempo, tornando incerta a posse ou a recusa de cadeiras de deputado, de senador e é possível que também de governador.
O STF não pararia por aí sua colaboração animadora. Ao pedir vista, ou seja, suspensão do julgamento já em 7 a 0 contra a exigência ao e leitor de título e documento com foto, o ministro Gilmar Mendes apropriou-se de um poder valioso. Poderia sustar a proclamação do decidido pelo tribunal até depois das eleições, como convinha a José Serra. A retomada do julgamento 24 horas depois é atribuída a uma tensa reunião dos ministros do STF, conclamando Gilmar Mendes a apresentar seu voto no que seria a última sessão antes das eleições. Era urgente evitar mais consequências para a imagem já exaurida e a responsabilidade já comprometida do tribunal.
Gilmar Mendes e José Serra negam o telefonema do candidato ao ministro, relatado na Folha pelos jornalistas Moacyr Lopes Filho e Catia Seabra, pouco antes do pedido de vista. Negação sem utilidade. Ninguém esperaria pela confirmação.
Útil foi a sinceridade de outro ministro, Ayres Britto, ao confirmar sem subterfúgios que sabia de conversas do seu genro com Joaquim Roriz, em torno de possíveis modos de salvar, no STF, esse candidato de ficha suja. Mas também sem utilidade é a explicação, servida pelo ministro, de que seu genro, o advogado Adriano Borges da Silva, caiu em uma "armadilha".
Não faz diferença se a iniciativa da conversa foi do advogado ou de Roriz, se foram pedidos R$ 4 milhões ou nada para tornar Ayres Britto impedido no julgamento: só o encontro com Roriz, que seria julgado por Ayres Britto, já é uma transgressão à probidade pessoal e à ética profissional de advogado. Por decisão de seu presidente, Ophir Cavalcante, a OAB vai investigar o ocorrido -mas desde logo fica dispensada de seguir os exemplos mais atuais do STF. Em tempo: Ayres Britto deu um dos cinco votos contrários a Roriz, como dele era esperado, e nada o atinge na aventura do genro.
Ainda houve uma esperança de que, no instante final da campanha, os candidatos assumissem seu papel e desobrigassem o STF de fazê-lo por eles. Passado em vão esse instante, os espectadores do debate na TV Globo se perguntavam por que Serra não investiu contra Dilma Rousseff. Explica-se: Serra supôs que Marina Silva fosse cuidar desse trabalho. Por ela e por ele. Enquanto lhe caberia o inadequado papel de pessoa pacífica. Não funcionou. Ali, pelo menos. No geral, saberemos logo mais.


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