São Paulo, sexta-feira, 06 de maio de 2011

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ANÁLISE

Conjuntura permite tolerância a intervenção na mineradora

SÉRGIO LAZZARINI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Muito se falou sobre a troca de comando da Vale e a participação do governo no imbróglio. Analistas ressaltam que o mercado já incorporou esse "risco governo" nos preços das ações.
Até porque a semente da interferência foi plantada de longa data, quando fundos de pensão de estatais e o BNDES foram estimulados a entrar em blocos de controle de empresas privatizadas.
A saída de Roger Agnelli não significa que agora o governo resolveu dar as cartas, uma vez que ele próprio já foi "habitué" do Planalto.
Mas o que isso implica? A principal investida do governo tem buscado direcionar a empresa para uma maior industrialização local ou "valor adicionado".
Avançar em siderurgia quando as maiores oportunidades são em mineração significa reduzir naco do lucro. Enquanto as commodities continuarem indo bem, a Vale terá boas perspectivas, e o cenário continuará permitindo tolerância com o Estado.
Pensando estrategicamente: faz sentido a intervenção? Antes de mais nada, adicionar valor ao produto não significa adicionar valor à empresa e ao Brasil. Qualquer país pode investir em siderurgia; é só captar recursos para montar uma unidade e comprar minério.
Mas poucos conseguem exportar matéria-prima. O recurso estratégico é justamente o minério. Mais ainda: o fato de certas commodities serem "básicas" não significa que a produção assim o é. Para "abrir buracos e exportar minério" (usando a expressão de Lula) é preciso toda uma cadeia complexa.
Como os exemplos de Chile, Noruega e Austrália demonstram, depender da exportação de matérias-primas não é necessariamente ruim. Tudo vai depender de como o governo usa as receitas dessas exportações para investir em áreas que permitam, no longo prazo, uma maior diversificação e competitividade da economia (por exemplo, educação).
Adicionar valor ao produto pode só representar menos valor ao acionista e menos desenvolvimento à empresa.
Por enquanto, a boa conjuntura ajuda a encobrir essas amarras à estratégia da Vale. Mas até quando?

SÉRGIO LAZZARINI é professor do Insper e autor do livro "Capitalismo de Laços: os Donos do Brasil e suas Conexões".


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