São Paulo, quarta-feira, 13 de julho de 2011

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JANIO DE FREITAS

Um leve sabor


Os EUA e a União Europeia vivem o sofrimento que impuseram em tão larga escala por benefício próprio


SEI QUE NÃO É um sentimento a ser exposto em público, mas quantas vezes, em quase três quartos da vida, precisei engolir o gosto ácido de que o jornalismo também é capaz?
Foi com prepotência, com mal disfarçado gozo pela humilhação imposta, com a força do neocolonialismo em sua forma financeira, que os Estados Unidos e o bloco entendido como Europa tripudiaram sobre nós, em nossos decênios de desarranjos econômicos e financeiros. Mais desemprego, maiores arrochos salariais, aposentadorias mais degradantes, câmbio extorsivo, "defaults" e rolagens com juros de assaltantes cada vez mais gananciosos -eram as ordens e exigências deles que constituíam os assuntos de todos os dias, no país reduzido ao estado de servidão financeira.
Tudo o que o Brasil empobreceu ou deixou de progredir, nas gerações daqueles decênios sucessivos, foi tragado pelos ricos ocidentais, para seu viver mais afortunado.
Os Estados Unidos padecem, agora, o desespero de encontrar uma saída até 2 de agosto para escapar à bancarrota. Os europeus ocidentais deblateram, choram em pânico, uns, o que precisem gastar para não serem arrastados pela ruína de irmãos da comunidade; desatinam-se, outros, com os primeiros passos no futuro que a comunidade lhes prepara.
Estados Unidos e a hoje União Europeia experimentam, ou por pouco ou por breve que seja, o sofrimento que impuseram em tão larga escala, com tanta indiferença pelas vidas dolorosas e com tanto benefício próprio. E isso, ao menos para mim, tem um sabor algo refrescante. O carreirismo economista dirá que é um sentimento idiota, porque não estamos protegidos de respingos amanhã e não lucramos com o problema de Estados Unidos e Europa. A dedução é correta -para quem só pensa em lucro.

O NOVO
A nomeação de um técnico de carreira, concursado, para ministro dos Transportes tem a dimensão de um ato correto sem precedente nesse setor fundamental, mais do que quase todos os outros, em país do tamanho e com as características do Brasil.
E vem com mais um significado: contrariamente aos costumes implantados pelos governos Fernando Henrique e Lula, repele a sujeição da Presidência à chantagem do apoio político pago com o cargo e sobretudo as verbas e os negócios do ministério.
Como sobremesa para este banquete de um só e grande prato, Dilma Rousseff determinou ao BNDES afastar-se dos negócios do Grupo Pão de Açúcar com o Carrefour. Pode ser, além disso, o necessário começo da revisão de política do BNDES, que deu à associação com empreendimentos privados uma relevância mais do que polêmica.

O PIOR
A gravidade do mensalão não comporta ressalvas. Mas o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, perdeu o indispensável equilíbrio ao escrever que se "trata da mais grave agressão aos valores democráticos que se possa conceber".
Em uma democracia extirpada por 21 anos de arbitrariedade militar, por um entre tantos golpes de Estado, em país onde o Congresso foi fechado várias vezes e o Judiciário amputado à força, é inverdade histórica atribuir a qualquer outra o caráter de "mais grave agressão aos valores democráticos".


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