São Paulo, sexta-feira, 13 de agosto de 2010

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MICHAEL KEPP

Comparando campanhas


No Brasil, ninguém quer pagar o preço da exposição pública que ocorre nos EUA

SE NOS ESTADOS Unidos uma campanha presidencial é como uma maratona, um teste de como um candidato resiste a uma exposição longa e constante à observação pública, no Brasil uma campanha similar se parece mais com uma corrida de 100 metros rasos, na qual a exposição é comparativamente mínima.
O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) permite que os candidatos iniciem suas campanhas apenas três meses antes da eleição, o que oferece ao público pouco tempo para avaliá-los.
Pelo começo de agosto, Dilma Rousseff havia se tornado líder nas pesquisas mesmo que seja quase desconhecida do público, por nunca ter disputado uma eleição. Em um país no qual os partidos políticos escolhem seus candidatos por trás de portas fechadas, bastou que Dilma fosse a escolhida de Lula.
Nos Estados Unidos, nenhum presidente tem o poder de sagrar candidatos dessa maneira. E tampouco existe um equivalente ao TSE. Por isso, os aspirantes à Presidência muitas vezes iniciam suas campanhas quase dois anos antes da eleição. Essa disputa é decidida nas primárias, onde o público vota para escolher o candidato de seu partido.
As últimas primárias do Partido Democrata, realizadas em quase todos os 50 Estados americanos, duraram seis meses e fizeram de Barack Obama um candidato bem conhecido e um oponente experiente para enfrentar John McCain, do Partido Republicano.
No Brasil, a exposição pública do candidato fica limitada principalmente ao horário gratuito de propaganda eleitoral e a debates na televisão. Nos Estados Unidos, onde não existe horário gratuito, candidatos e organizações privadas formadas para elegê-los precisam arrecadar dinheiro para bancar propaganda na TV.
Em 2008, grupos de direita bancaram comerciais de TV que alegavam, falsamente, que Obama tinha conexões com antigos terroristas.
A necessidade de que um candidato se defenda contra acusações desse tipo também faz da disputa presidencial americana um teste de resistência e de temperamento.
Porque os candidatos nos Estados Unidos precisam atingir um público fortemente polarizado, não apenas tomam parte em debates como se submetem a formatos de entrevistas muito mais hostis e desafiadores que os candidatos brasileiros.
Obama foi interrogado por um comentarista da Fox News, um canal de notícias de direita que apoiava McCain. Um popular pastor evangélico entrevistou McCain e Obama sobre suas crenças religiosas.
Porque o posto de primeira-dama tem forte importância simbólica nos Estados Unidos, as mulheres dos candidatos precisam participar de programas de entrevistas. Os Obama chegaram a permitir que um repórter de TV fizesse perguntas pessoais às suas jovens filhas sobre a relação com o pai, algo que seria impensável no Brasil.
Quando Bill Clinton era candidato à Presidência, em 1992, participou de programas de entrevistas nos quais tocou seu saxofone, de óculos escuros, um gesto de autopromoção que confundia a distinção entre política e entretenimento.
Em resumo, disputar a Presidência nos Estados Unidos significa se promover ao permitir que a mídia invada sua vida e a de sua família. Essa constante exposição pública é obrigatória para todos os candidatos à Casa Branca. E é um preço que nenhum brasileiro que dispute o posto aqui jamais terá de pagar.


MICHAEL KEPP , jornalista norte-americano radicado há 27 anos no Brasil, é autor do livro de crônicas "Sonhando com Sotaque - confissões e desabafos de um gringo brasileiro", (ed. Record); site: www.michaelkepp.com.br ; email: mkepp@terra.com.br

AMANHÃ EM PODER:
Claudio Weber Abramo


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