São Paulo, quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

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Grampo revela compra de votos em RR

Conversas entre parentes e assessores do governador reeleito mostram oferta de benefícios em troca de apoio

Há evidência de três crimes: abuso de poder econômico e político e captação de sufrágio de maneira irregular

RENATA LO PRETE
EDITORA DO PAINEL

FABIO ZAMBELI
DO PAINEL

Gravações de conversas das quais participaram familiares e auxiliares diretos do governador reeleito de Roraima, José de Anchieta Jr. (PSDB), revelam oferta de dinheiro e benefícios em troca de apoio na eleição mais disputada do país, vencida pelo tucano no segundo turno por 1.700 votos de diferença.
A Folha teve acesso aos diálogos, gravados por participantes e encaminhados ao Ministério Público. Eles mostram ofensivas distintas na tentativa de persuadir eleitores por meio de ajuda oficial.
Na mais emblemática, a mulher do governador, Shéridan Anchieta, promete incluir moradoras de um bairro da periferia da capital, Boa Vista, no programa de complementação de renda "Vale Solidário", coordenado por ela, mediante insistentes apelos de voto no marido.
"O que está faltando para esse voto? Fala aí", indaga a uma potencial beneficiária.
"Então diga: o que a senhora quer pra votar no Anchieta?", pergunta, sem mais rodeios, a primeira-dama.
Em outra conversa, o procurador-geral do Estado, Francisco das Chagas Batista, negocia repasse de recursos para a comunidade indígena da Boca da Mata.
Ele pergunta ao líder local José Newton Simão de Lima a quantia necessária para "ajudar o 45", em referência ao número do candidato tucano: "O que você precisa pra nos ajudar lá?". Quando Lima fala em recursos, o procurador vai direto ao ponto: "Quanto, homem?".
Em outro diálogo, gravado um dia depois do segundo turno, o irmão de Anchieta, Janser José Teixeira, ouve de uma colaboradora a cobrança da entrega de R$ 200 para cada integrante de um grupo de 30 eleitores que teria prometido votar no tucano. "O homem ganhando, eu tô repassando os R$ 200 pra cada pessoa e foi o que eu prometi pra eles, entendeu?", diz Márcia Sebastiana da Silva.
Janser discorda no que diz respeito à data do pagamento: "Eu falei o seguinte: ele ganhando, a gente resolve.
Eu não determinei um dia".

ABSTENÇÃO COMPRADA
Depoimentos colhidos pelo Ministério Público indicam ainda outra iniciativa: o estímulo à abstenção por meio do recolhimento dos documentos de eleitores interessados em ingressar nos programas sociais.
O material será usado pela coligação liderada por Neudo Campos (PP), segundo colocado na eleição, em ação que pede a cassação do registro de Anchieta, cuja diplomação será amanhã. O recurso será protocolado hoje no Tribunal Regional Eleitoral.
Os advogados do pepista sustentam que há evidências de três crimes de natureza eleitoral: abuso de poder econômico, abuso de poder político e captação ilícita de sufrágio (compra de votos).
Neudo, que governou o Estado entre 1995 e 2002, renunciou ao mandato de deputado federal em agosto, em manobra destinada, no entender de seus adversários, a deslocar os processos a que responde do Supremo para a primeira instância.
Com 271.890 eleitores, o menor colégio do país, Roraima abriga uma espécie de mercado aberto de votos. Na véspera do segundo turno deste ano, reportagem da Folha testemunhou cenas em que moradores de Boa Vista negociavam sua opção na base do "quem dá mais".
Trata-se de uma "tradição local", nas palavras do procurador regional eleitoral Ângelo Goulart Villela. "Durante a campanha, o eleitor é aliciado por meio do assistencialismo", disse ele naquela ocasião.

FOLHA.com
Ouça as conversas
folha.com.br/mm846394


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