São Paulo, sábado, 17 de julho de 2010

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CLAUDIO WEBER ABRAMO

Silêncio e mistificação


É interessante que não seja inaceitável que um candidato se cale sobre corrupção


CONFORME SEMPRE mostram os levantamentos de opinião, a corrupção é um dos temas que mais preocupam o brasileiro. Apesar disso, o seu combate não aparece em campanhas eleitorais. Geralmente os candidatos nada têm a dizer a respeito -e, de toda forma, jamais são questionados sobre isso em debates, sabatinas e entrevistas.
O principal motivo para o silêncio é o fato de o assunto costumar ser tratado no plano moral. Quando se menciona a corrupção, o que mais se ouve são alusões a defeitos individuais do ser humano, o que leva à pseudoexplicação de que ela seria um problema "cultural".
Uma vez adotado esse ponto de vista, nada mais há a discutir senão exortações vago-genéricas que, uma vez distiladas, se reduzem à expressão do desejo de que seria melhor se as pessoas se comportassem de outra forma. Em suma, mistificação.
Não se deveria permitir que candidatos em eleições, em qualquer nível, escapassem de forma tão conveniente. Ainda mais porque, sendo todos eles familiarizados com os mecanismos da corrupção, com a qual conviveram ao longo de suas vidas públicas, é impossível que desconheçam ao menos algumas de suas principais causas objetivas.
Portanto, não é crível que ignorem transformações legais e administrativas que poderiam estimular e promover para reduzir a corrupção caso venham a ser eleitos.
Observe-se que isso vale não apenas para candidatos à Presidência da República como, também, para quem concorre aos governos estaduais. Corrupção não acontece só em Brasília. Vale ainda para candidatos ao Senado, à Câmara dos Deputados e às Assembleias Legislativas, pois são esses os responsáveis tanto pela promulgação de leis quanto pela fiscalização do Executivo.
É interessante que, no Brasil, se julgue impensável que um candidato silencie sobre temas cansativamente recorrentes da educação, da saúde, do saneamento e assim por diante (é claro que os contendores sempre dizem as mesmas trivialidades pasteurizadas), mas não se considere inaceitável que alguém busque o voto do eleitor sem se manifestar sobre as causas das perdas provocadas pela corrupção e como reduzi-las.
Fica a sugestão aos idealizadores de debates eleitorais no sentido de sempre formularem aos candidatos a qualquer cargo duas perguntas: 1) quais são, em seu entender, as causas da corrupção? e 2) se eleitos, qual o programa que pretendem executar para reduzi-la?
Respostas situadas no terreno embromatório da moral e da "cultura" assinalarão ignorância injustificável (na melhor das hipóteses) ou intenção deliberada de evitar o assunto.


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