São Paulo, sexta-feira, 20 de agosto de 2010

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MOISÉS NAÍM

Eleições sob os olhos do mundo


O novo presidente será acompanhado muito mais de perto pelos outros países


A ESCOLHA do presidente dos Estados Unidos não pode ser deixada a cargo unicamente dos americanos. As decisões do presidente dos EUA têm tantas consequências para o resto do mundo que o justo seria que todos participássemos de sua eleição. Lemos essa ideia -que, obviamente, é mais uma provocação retórica que uma proposta realista- cada vez que há eleições presidenciais nos Estados Unidos.
Nunca a tínhamos lido com respeito ao Brasil. Mas já chegou o momento de aplicá-la a esse país. As decisões do próximo presidente brasileiro terão enormes consequências para outros países, especialmente na América Latina. Está claro que as opiniões e preferências dos vizinhos não terão peso algum na eleição de outubro próximo. A política é e será sempre local. Mas é importante reconhecer que as eleições brasileiras já não são o que eram.
Até poucos anos atrás, as decisões do presidente brasileiro não tinham maiores repercussões internacionais, e a atenção que o mundo prestava a esses eleições refletia essa irrelevância. Durante décadas a influência do Brasil foi menor do que justificariam seu tamanho, sua população, sua importância econômica ou seu poderio militar.
Cuba, por exemplo, que tem menos habitantes que São Paulo, cujo território equivale à 80ª parte do brasileiro e cuja economia equivale à 32ª parte da do Brasil, teve -e, sob certos aspectos, continua a ter- mais influência na América Latina que o Brasil.
Nos últimos anos, porém, graças às políticas lançadas por Fernando Henrique Cardoso e levadas adiante e ampliadas por Lula, o Brasil vem passando por um progresso extraordinário que permite e obriga que o país desempenhe um papel internacional mais proporcional a seu peso econômico e político.
O Brasil é hoje um convidado indispensável nas mesas em que os países mais influentes tomam decisões sobre o comércio e o sistema financeiro internacional, as mudanças climáticas, a energia, a proliferação nuclear, a guerra e a paz e um rol interminável de desafios que ninguém pode se dar ao luxo de enfrentar sozinho.
Essa nova situação cria oportunidades interessantes para o Brasil e seu presidente, mas também novos problemas. Talvez o mais difícil destes seja que seus políticos, empresários, sindicatos, intelectuais e líderes sociais reconheçam que essa posição de influência vem acompanhada de custos e responsabilidades.
Os países não têm amigos, apenas interesses, diz a frase comum. É verdade. Mas também têm valores e princípios, e às vezes devem atuar internacionalmente em defesa de princípios, mesmo que isso seja feito às expensas de seus interesses.
Algumas empresas brasileiras, por exemplo, tiveram ganhos extraordinários na Venezuela. Mas será que isso justifica o silêncio do Brasil diante dos assassinatos de sindicalistas, ataques a jornalistas e outras violações dos direitos humanos que ocorrem na Venezuela?
De agora em diante, as atuações do presidente do Brasil serão acompanhadas muito mais de perto que antes no âmbito internacional, e a improvisação e os erros terão custos mais altos. E o restante do mundo -sobretudo a América Latina- vai esperar muito mais de um Brasil mais bem-sucedido e influente do que jamais foi no passado.

MOISÉS NAÍM é o principal colunista internacional do "El País" e "senior associate" do Carnegie Endowment for International Peace, em Washington.

Tradução de Clara Allain


AMANHÃ EM PODER:
Claudio Weber Abramo




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