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CNJ cancela 5,5 mil registros de terra irregulares no Pará
Decisão marca o início do fim da grilagem no Estado, afirma procurador
Medida transfere para o dono da terra o ônus da prova de que seu título é legal; cartórios têm 30 dias para anular papeis
FELIPE SELIGMAN
CLAUDIO ANGELO
DE BRASÍLIA
O CNJ (Conselho Nacional
de Justiça) determinou o cancelamento de 5,5 mil registros de terra do Estado do Pará considerados irregulares.
A maior parte dos papéis é
possivelmente fruto de grilagem, nome dado à apropriação ilegal de terras públicas.
Somados, os títulos equivalem a quase um Pará a
mais. Ou seja, é como se a
área real do Estado fosse
uma, e sua área titulada fosse
quase duas vezes maior.
O corregedor do CNJ, Gilson Dipp, autor da decisão
publicada ontem, disse que o
tamanho das terras não pode
ser superior ao previsto pela
Constituição vigente no momento em que as propriedades foram registradas. A
Constituição veda a cessão a
particulares de grandes extensões de terras públicas
sem autorização do Senado.
Por isso o CNJ cancelou todos os imóveis com área superior a 10 mil hectares registrados de 1934 até 1964; com
mais de 3.000 hectares registradas de 1964 até 1988; e
com mais de 2.500 hectares a
partir de 5 de outubro de 88.
Esses eram os limites de área
que podiam ser transferidos
do Estado a particulares sem
autorização do Senado pelas
Cartas Magnas de 1934, 1964
e 1988, respectivamente.
Os registros irregulares vinham sendo investigados
desde 2007 por uma comissão formada pelo Iterpa (Instituto de Terras do Estado do
Pará), pelo Incra e pelo Ministério Público Federal, entre outras instituições.
Esse trabalho abriu uma
janela para o tamanho do
problema da grilagem no Pará. Descobriu-se, por exemplo, que uma única fazenda
registrada em Altamira tinha
410 milhões de hectares
-metade do Brasil. Esse título foi cancelado já em 2009.
Descobriu-se também que
um único fazendeiro, Carlos
Mendes (que não existe), tinha 167 títulos irregulares,
com 1,8 milhão de hectares,
ou três Distritos Federais. E
que o município de Moju tinha tituladas terras equivalentes a 14 vezes sua área.
CANCELAMENTO
Em 2009, a comissão solicitou à Corregedoria do Tribunal de Justiça do Pará o
cancelamento de mais de
6.000 títulos. O TJ negou. A
comissão recorreu, e o CNJ
ordenou o cancelamento.
"Hoje é o início do fim da
grilagem no Pará", disse o
procurador Felício Pontes. O
Ministério Público vai agora
apurar a responsabilidade
criminal dos proprietários:
"Suspeitamos que tenham
recebido financiamento de
bancos públicos", disse ele.
Segundo Girolamo Treccani, diretor do Iterpa, a decisão do CNJ é histórica: primeiro, ela transfere ao proprietário o ônus da prova de que seu título é regular: "Ele
vai ter de mostrar ao cartório
que adquiriu as terras do rei
de Portugal ou de qualquer
que seja o agente público".
A decisão facilita o combate à grilagem porque permite
cancelar títulos irregulares
por decisão administrativa;
até agora, isso só podia ser
feito por ação judicial.
A decisão não veda as propriedades grandes no Pará,
desde que elas tenham sido
formadas por áreas adquiridas regularmente. Os cartórios terão 30 dias para cancelar os títulos. Os donos das
terras podem recorrer.
"A grilagem de terra no Pará é conhecida de todos. O sul
do Estado tem a maior quantidade de grilagem. Coincidentemente, tem os maiores
índices de desmatamento e
de homicídios", disse Dipp.
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