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Dilma tinha código de acesso a arsenal usado por guerrilha
Revelação foi feita em 1970 sob tortura por ex-colega da petista na luta armada e confirmada por ele em entrevista
Grupo VAR-Palmares guardava em imóvel 58 fuzis e 4 metralhadoras; armamento foi roubado de batalhão do ABC
MATHEUS LEITÃO
LUCAS FERRAZ
DE BRASÍLIA
A presidente eleita, Dilma
Rousseff, zelava, junto com
outros dois militantes, pelo
arsenal da VAR-Palmares,
organização que combateu a
ditadura militar (1964-1985).
Entre os armamentos, havia 58 fuzis Mauser, 4 metralhadoras Ina, 2 revólveres, 3
carabinas, 3 latas de pólvora,
10 bombas de efeito moral,
100 gramas de clorofórmio, 1
rojão de fabricação caseira, 4
latas de "dinamite granulada" e 30 frascos com substâncias para "confecção de
matérias explosivas", como
ácido nítrico. Além de caixas
com centenas de munições.
A descrição consta do processo que a ditadura abriu
contra Dilma e seus colegas
nos anos 70. A Folha teve
acesso a uma cópia do documento. Com tarja de "reservado", até anteontem ele estava trancado nos cofres do Superior Tribunal Militar.
Trata-se de depoimento
dado em março de 1970 por
João Batista de Sousa, militante do mesmo grupo de
guerrilha do qual Dilma foi
dirigente.
Sob tortura, ele revelou detalhes do arsenal reunido para combater a repressão e
disse que Dilma tinha recebido a senha para acessá-lo.
Quarenta anos depois,
Sousa confirmou à Folha o
que havia dito aos policiais
-e deu mais detalhes.
Dilma já havia admitido,
em entrevista à Folha em fevereiro, que na juventude fez
treinamento com armas de
fogo. O documento do STM,
porém, é a primeira peça que
a vincula diretamente à ação
armada durante a ditadura.
Procurada pela Folha, a
presidente eleita não quis falar sobre o assunto.
O armamento foi roubado
do 10º Batalhão da Força Pública do Estado de São Paulo
em São Caetano do Sul (SP),
de acordo com o DOPS (Departamento de Ordem Política e Social).
A ação ocorreu em junho
de 1969, mês em que as organizações VPR e Colina se fundiram na VAR-Palmares.
Sousa disse que foi responsável por guardar o arsenal após a fusão. Com medo
de ser preso, fez um "código"
com o endereço do "aparelho" -como eram chamados
os apartamentos onde militantes se escondiam.
Para sua própria segurança e do arsenal, Sousa dividiu o endereço do "aparelho" em Santo André (SP) em
duas partes.
Assim, só duas pessoas
juntas poderiam saber onde
estavam as armas. Uma parte
da informação foi entregue a
Dilma, codinome "Luisa". A
outra, passada a Antonio
Carlos Melo Pereira, guerrilheiro anistiado pelo governo
depois de morrer.
O documento registra assim a informação: "Que, tal
código, entregou a "Tadeu" e
"Luisa", sendo que deu a cada
um uma parte e apenas a junção das duas partes é que poderia o mencionado código
ser decifrado".
"Fiz isso para que Dilma,
minha chefe na VAR, pudesse encontrar as armas", diz,
hoje, Sousa.
Tido pelos colegas como
um dos mais corajosos da
VAR-Palmares, Sousa afirma
ter sido torturado por mais de
20 dias. Ficou quatro anos
preso e, hoje, pede indenização ao governo federal.
Aposentado, depois de trabalhar como relações públicas e com assistência técnica
para carros no interior de São
Paulo, ele diz ter votado em
Dilma. Na entrevista, chamou a presidente eleita de
"minha coordenadora".
"PONTOS"
Sousa contou que tinha
três "pontos" -como eram
chamados os locais e horas
de encontro na clandestinidade- com Dilma nos dias
seguintes à sua prisão. Mas
disse que não entregou as datas e endereços durante as
sessões de tortura -inclusive
com choques elétricos na
"cadeira do dragão".
Sousa participou de operações armadas, como assaltos
a bancos e mercados. "Informava todas as ações para Dilma com três dias de antecedência", declarou.
Com a "dinamite granulada", por exemplo, ele afirma
ter feito bombas com canos
de água "cortados no tamanho de quatro polegadas,
com pregos dentro".
Quando 18 militares à paisana cercaram seu "aparelho", Sousa os recebeu com
rajadas de metralhadoras e
com as bombas caseiras. Um
militar ficou ferido.
Os agentes conseguiram
uma trégua após duas horas
de intenso tiroteio.
Sousa diz que, meses depois, Dilma contou a ele que,
quando ele não apareceu nos
encontros previstos, ela usou
o código para pegar o arsenal: Dilma e Melo encontraram a casa perfurada de balas e a rua semelhante a uma
trincheira de guerra, com
enormes buracos.
O depoimento registra 13
bombas jogadas contra os
militares. Com um vizinho,
Dilma e Melo descobriram
que o companheiro esquerdista havia sido levado vivo
pela repressão.
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