São Paulo, terça-feira, 21 de junho de 2011

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JANIO DE FREITAS

Alguém quer agir


Se a ida da Força Nacional para as regiões de conflitos agrários se destinava a conter mortes, não conteve

UM DOS MUITOS efeitos negativos do caso Palocci foi obscurecer, no seu longo domínio da atenção jornalística, alguns fatos relevantes, dos quais dois retornam aqui. É a onda de mais assassinatos sucessivos na luta da terra e da madeira no Pará e, no Mato Grosso do Sul, o ataque com fogo a um ônibus que levava 35 estudantes índios.
Lá pelo quarto ou quinto assassinato em série, o Ministério da Justiça decidiu mandar algumas dezenas de integrantes da Força Nacional para a região, com agentes da Polícia Federal.
Se a ida se destinava a conter os assassinatos, não conteve. Se deveria proceder a investigações, identificar e prender assassinos e mandantes, não há informação de que sequer se aproximasse disso, com a suposição de pistas. Não houve informação alguma, aliás, de coisa nenhuma por lá, a não ser um assassinato a mais. Silêncio (ou sigilo também?) cuja permanência se deve, em comum, ao Ministério da Justiça e aos meios de comunicação.
Dentro de uma aldeia terena, em Miranda, a monstruosidade do crime é assombrosa: foi jogado um coquetel molotov no ônibus dos estudantes. O incêndio queimou quantidade não informada de índios, mas de quatro houve a notícia de sua internação em estado muito grave, na Santa Casa de Campo Grande. Desde então, começo do mês, nenhuma notícia sobre alguma providência do Ministério da Justiça. Ou sobre a exceção de uma descoberta da polícia estadual quanto à autoria ou ao mandante. Ou notícia dos meios de comunicação sobre o crime mesmo ou sobre o que veio a se passar com as vítimas.
Nos dois Estados, os crimes se deram em focos de conflito bastante conhecidos. E, como induz a tradição, sem medidas preventivas dos governos estaduais e do federal. Muito antes de sua inclusão nos fatos atuais, Eldorado do Carajás celebrizara-se há 15 anos com o massacre de 19 sem-terra, episódio a que juntou o assassinato da irmã Dorothy Stang. Eldorado, Marabá, Bico do Papagaio, a geografia regional foi se tornando conhecida, em Brasília, no Sudeste e no Sul, como as guerras ensinam um pouco de geografia ao Ocidente. Conhecimento, também este, inútil.
A violência que se passa em um foco de conflito apenas difere em grau, ou nas ondas de intensidade, do que é vivido nos outros focos. Centenas, é provável que milhares de focos. Nem por isso, cumprida já metade do seu primeiro ano de mandato, soube-se de uma só palavra no governo Dilma sobre essa desgraça nacional.
Ao menos de um setor institucional vêm uma ideia e a disposição de agir. Alarmados com a constatação de que, de 219 assassinatos no meio rural do Pará, só 4, nos últimos dez anos, tiveram processos judiciais, a Ajufe (Associação dos Juízes Federais do Brasil) lança a ideia de federalização dos processos de crimes contra direitos humanos. Ou seja, de transferência, para a Justiça Federal, dos processos e julgamentos de tais crimes.
A Justiça Federal não está sujeita às pressões das circunstâncias que agem sobre as polícias e instâncias judiciárias estaduais, assim como o Ministério Público Federal.
A Ajufe quer levar ao Congresso a proposta de emenda constitucional para definir os crimes contra direitos humanos e fazer a transferência inovadora. Merece todo o apoio possível - mas, sabe-se, incerto.


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