São Paulo, domingo, 23 de maio de 2010

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ANÁLISE POLÍTICA EXTERNA

Pretensão de Lula na ONU é pouco realista

Caso do Irã deixa claro que EUA e Europa tentam manter o máximo do poder que consolidaram no século 20


HÁ PROMESSAS DE MULTILATERALISMO, DAÍ O ACENO A LULA COM A PRESIDÊNCIA DO BANCO MUNDIAL; MAS O LIMITE DA PROMESSA PARECE SER SENTAR À MESA DA GOVERNANÇA, E NÃO TER UM PAPEL EFETIVO NELA

CLAUDIA ANTUNES
DO RIO DE JANEIRO

Há bastante de verdadeiro na avaliação -repetida por especialistas depois do acordo assinado por Irã, Brasil e Turquia- de que novos polos de influência estão abrindo caminho pelo mundo.
A dispersão foi acentuada pela crise nos países ricos do Ocidente, que levou as grandes economias "em desenvolvimento" a se tornarem parte do motor do crescimento, tendo por isso sido alçadas ao novo G20 financeiro.
Mas está para acontecer, se é que acontecerá, um big-bang que tornará as instituições da governança mundial mais representativas de uma "nova ordem multipolar" -por ora, mais um conceito idealizado do que uma definição palpável, como foi a bipolaridade da Guerra Fria.
O que existe, como ficou claro na reação ao acordo de Teerã, é um empreendimento decidido dos EUA -ainda de longe a maior potência militar e o maior PIB- e dos seus aliados europeus para manterem o máximo possível do poder que consolidaram no século 20.
Qualquer definição mais precisa do resultado disso dependerá da estabilidade futura e das opções da China, a grande potência ascendente. Por enquanto, mais por tática do que por convicção, Pequim tem preferido a acomodação ao confronto com os velhos poderes.
É do desfecho desse impasse histórico, improvável em curto prazo, que depende a concretização das pretensões internacionais de Lula.
Sua popularidade, seu investimento nas relações com América Latina, África e Oriente Médio e o paparico de que é alvo por parte dos líderes das potências não lhe garantem cargos que significam projeção e movimentam muito dinheiro.
Paradoxalmente, a personalidade forte do brasileiro joga contra ele.
A reforma da ONU e do seu Conselho de Segurança, que o ex-secretário-geral Kofi Annan tentou levar adiante, está parada, com pouca chance de ser retomada.
O governo brasileiro acredita ter superado a resistência dos vizinhos à cadeira que almeja no órgão ainda formalmente responsável pela paz e a segurança internacionais. Mas não há a mínima unanimidade na Ásia, por exemplo, sobre o ingresso do Japão e da Índia.
Em seu estilo apagado, o atual secretário-geral, Ban Ki-moon, representa um coletivo que pouco consegue se mover, seja para concluir a Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio, seja para dar uma conclusão com credibilidade à conferência de Copenhague, sobre mudança climática.
Esses fóruns revelaram a predominância do que os acadêmicos chamam agora de "coalizões de geometria variável", alianças em torno de interesses pontuais que não se repetem quando se trata de compromissos mais abrangentes.
É verdade que há promessas de multilateralismo, no qual a diplomacia se sobrepõe à força.
Por isso o aceno a Lula com a presidência do Banco Mundial, cargo que há 65 anos pertence aos EUA, assim como a direção do FMI é ocupada por um europeu.
Mas o limite da promessa parece ser sentar à mesa ampliada da governança, e não tanto ter papel efetivo na formulação das regras. Basta ver como evaporaram, no caso iraniano, as loas do francês Nicolas Sarkozy à "aliança estratégica" com o Brasil.


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