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Vermelhos contra Lula
Em debate, presidenciáveis de esquerda são cordiais entre si, mas não poupam munição contra Dilma e o presidente
BERNARDO MELLO FRANCO
DE SÃO PAULO
Os três candidatos à Presidência já estavam sentados
lado a lado, à espera da primeira pergunta, quando um
homem de jeans e camiseta
anunciou que a Liga Bolchevique Internacionalista tinha
uma questão de ordem:
"Defendemos o boicote às
eleições presidenciais. Queremos debater essa posição
com os presidenciáveis".
Os convidados fizeram cara de paisagem. Após um instante de silêncio, o mediador
pediu a compreensão do
"companheiro", que voltou à
sua cadeira sem reclamar.
Foi a única nota fora do
script no debate dos candidatos nanicos de esquerda, promovido anteontem à noite
pelo jornal "Brasil de Fato".
Participaram Ivan Pinheiro (PCB), Zé Maria (PSTU) e
Rui Costa Pimenta (PCO), todos abaixo de 1% nas pesquisas. Com lugar garantido nos
debates da TV, Plínio de Arruda Sampaio (PSOL) fez forfait e virou alvo dos colegas.
"É uma ausência desrespeitosa", esbravejou Pinheiro, acusando o rival de se
reunir com empresários no
mesmo dia. "Esperamos que
ocorra uma autocrítica."
CAMARADAGEM
O encontro durou quase
duas horas, em clima de cordialidade absoluta.
Por acordo entre os partidos, eles não puderam fazer
perguntas entre si, o que
transformou o debate num
monocórdio revezamento de
ataques à imprensa, à Justiça
Eleitoral, aos bancos e, principalmente, ao governo Lula.
"Este é um governo antipopular e reacionário", afirmou Pimenta, que militou no
PT até 1992. "O Lula roubou a
base do DEM, os latifundiários. É uma coisa espantosa."
"Quem vai sentir saudade
do Lula é a burguesia. Ela
não tinha ninguém melhor
para atuar como bombeiro
da luta de classes", emendou
Pinheiro, do Partidão.
Zé Maria, cuja legenda
também descende do PT,
condenou as tropas ao Haiti
-segundo ele, prova de submissão ao imperialismo americano. "É uma vergonha para o nosso país", sentenciou.
Os debatedores não se curvaram aos trunfos da gestão
petista. Contrário ao Bolsa
Família, o candidato do PCO
declarou que o programa foi
idealizado pelas "instituições financeiras imperialistas que saquearam o Brasil",
numa trama para "conter a
explosão social".
O representante do PSTU
disse duvidar dos índices que
apontam redução da desigualdade social: "O cenário
que vemos é diferente, e a
perspectiva para os trabalhadores é cada vez pior."
À medida que o evento se
aproximava do fim, a mira se
deslocou de Lula para a sua
candidata. Os três deixaram
claro que, mesmo desunidos,
farão oposição em caso de vitória de Dilma Rousseff (PT).
"O comando da campanha
dela já está traçando uma nova Reforma da Previdência.
Precisamos nos preparar",
conclamou Zé Maria.
"O governo da dona Dilma
tem uma missão clara. Vem
aí um conjunto de medidas
muito duras contra os trabalhadores", alertou Pimenta.
"Quero denunciar que uma
delas, já em marcha, é a privatização dos Correios."
Pinheiro criticou os "companheiros que estão fazendo
o voto útil na Dilma", mas admitiu ter poucas chances de
ser ouvido: "O três de outubro já acabou".
Apesar do pessimismo
com as urnas, os presidenciáveis se disseram a postos
para uma "nova etapa de luta". "A burguesia fará uma
nova ofensiva contra os trabalhadores imediatamente
após as eleições", alertou o
candidato do PCO.
O concorrente do PCB contou que sonha com uma nova
onda de greves, semelhante
à iniciada em 1979. Desta vez
não citou Lula, que comandou o movimento no ABC.
PERPLEXIDADE
Entediados com o clima
morno, militantes que acompanhavam o debate pela internet preferiram usar o chat
do "Brasil de Fato" para debater a demissão de funcionários públicos em Cuba.
O assunto, que causa polêmica na esquerda, foi ignorado pelos presidenciáveis.
Na saída, Pimenta admitiu
que a falta de contraditório
pode ter confundido quem
esperava usar o encontro para descobrir diferenças entre
os candidatos.
"Vai ficar uma surpresa,
uma perplexidade, porque
os nossos partidos não estão
unidos", disse. "Mas isso é
natural. Nossa preocupação
não era colocar as divergências em evidência".
"O formato do debate acabou não permitindo confrontações", concordou Pinheiro.
"Mas o fato de termos dito
coisas que o povo não consegue ouvir já é uma vitória".
Segundo o PCO, o pico de
audiência na internet foi de
2.500 acessos simultâneos.
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