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Quanto mais religioso, mais pobre tende a ser um país
Correlação é conclusão de pesquisa feita em 114 nações; EUA são exceção
Para líder ateu, religião rapta bens, dinheiro e mentes que deixam de ser empregados em atividades econômicas
HÉLIO SCHWARTSMAN
ARTICULISTA DA FOLHA
Quanto mais religiosos são
os habitantes de um país,
mais pobre ele tende a ser.
Essa é a conclusão de uma
pesquisa Gallup feita em 114
nações e divulgada no último
dia 31 que mostra uma correlação forte entre o grau de religiosidade da população e a
renda "per capita".
Correlação, vale lembrar, é
um conceito traiçoeiro.
Quando duas variáveis estão
correlacionadas, tanto é possível que qualquer uma delas
seja a causa da outra como
também que ambas sejam
efeitos de outros fatores.
Desde o século 19, a sociologia tem preferido apostar
na tese de que a pobreza facilita a expansão da religião.
"Em geral, as religiões ajudam seus adeptos a lidar com
a pobreza, explicam e justificam sua posição social, oferecem esperança, satisfação
emocional e soluções mágicas para enfrentar problemas
imediatos do cotidiano", diz
Ricardo Mariano, da PUC-RS.
"As religiões de salvação
prometem ainda compensações para os sofrimentos e insuficiências desta vida no outro mundo", acrescenta.
O sociólogo, porém, lembra que há outros fatores: "A
restrição à liberdade religiosa, ideologias secularistas e o
ateísmo estatal dos países socialistas contribuíram para a
baixa importância que sua
população atribui à religião,
como ocorre na Estônia,
campeã nesta matéria, e na
própria Rússia".
Já na Europa Ocidental,
diz Mariano, "modernização,
laicização do Estado e relativismo cultural erodiram bastante a religiosidade".
A grande exceção à regra
são os EUA. Com uma das
maiores rendas "per capita"
do planeta, 65% dos norte-americanos atribuem importância à religião em sua vida
diária. Tal índice é bem superior à média dos países mais
ricos, que é de 47%.
Sem descartar um papel
para as explicações sociológicas mais tradicionais, que
chama de "fator ópio do povo", Daniel Sottomaior, presidente da Atea (Associação
Brasileira de Ateus e Agnósticos) aventa algumas hipóteses na direção contrária, isto
é, de que a religião é causa da
pobreza. "Ela promove o fatalismo e o deus-dará", diz.
Em certos lugares, notadamente alguns países islâmicos, ela desestimula a educação e impede a adoção do
pensamento científico.
Além disso, afirma Sottomaior, "a religião não apenas
não gera valor como sequestra bens, dinheiro e mentes
que deixam de ser empregados em atividades econômicas e de desenvolvimento".
RELIGIOSOS
Para religiosos ouvidos pela Folha, é a riqueza que pode reduzir o pendor das pessoas à religiosidade.
Segundo o padre jesuíta
Eduardo Henriques, "a abertura a Deus é inversamente
proporcional à segurança
oferecida pela estabilidade
econômico-financeira, com
exceções, é claro. Espiritualmente falando, os pobres tornam-se sinais mais eloquentes de que ninguém, pobre
ou rico, basta a si mesmo. Por
isso Jesus chamou os pobres
de bem-aventurados".
Já para o pastor batista
Adriano Trajano, a pesquisa
mostra que quanto maior for
o estado de pobreza e pouco
desenvolvimento econômico
no país, "maior será a busca
por subterfúgios sobrenaturais, pois a religião tem esse
poder de transportar o necessitado a um mundo de cordas
divinas". "Que a religião desempenha um papel importante nas sociedades, não há
dúvida, resta saber até que
ponto esse papel favorece a
vida?", pergunta.
O teólogo adventista Marcos Noleto é mais radical:
"Há uma incompatibilidade
da fé prática com a riqueza.
Assim como dois corpos não
podem ocupar um mesmo lugar no espaço, na mente do
homem não há lugar para
duas afeições totais. Veja que
Deus escolheu um carpinteiro e não um banqueiro para
ser o pai de Jesus".
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