São Paulo, segunda-feira, 27 de setembro de 2010

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Eleição divide grupo desenvolvimentista

Economistas que impulsionaram no Brasil teses formuladas na Cepal mantêm relações com Serra e com Dilma

De 9 membros do grupo com atuação no debate público, 3 estão com o tucano e 2 com a petista; outros não dizem posição

CLAUDIA ANTUNES
DO RIO

A eleição presidencial divide um grupo de economistas que, na segunda metade do século 20, impulsionou a difusão no Brasil das teses desenvolvimentistas -que influenciaram tanto o tucano José Serra quanto a petista Dilma Rousseff.
Inspirados por pensadores da Cepal (Comissão Econômica para a América Latina), como Celso Furtado e Aníbal Pinto, esses economistas são, na maioria, amigos de longa data de Serra, que aprofundou os laços com a corrente no Chile, onde ele esteve exilado.
Parte deles deu aulas para Dilma na Unicamp, e muitos se aproximaram do governo Lula, em especial quando o crescimento e depois a crise global de 2008 abriram caminho para um papel maior do Estado na economia.
De 9 integrantes do grupo com atuação no debate público, 2 estão publicamente com Dilma: Maria da Conceição Tavares, 80, ex-deputada pelo PT e professora emérita da UFRJ; e Luciano Coutinho, 64, presidente do BNDES e cotado para ministro da Fazenda num eventual governo da petista.
Três estão com Serra: Claudio Salm, 68, professor da UFRJ e ex-assessor do tucano no Ministério da Saúde; Carlos Lessa, 74, professor emérito da UFRJ que presidiu o BNDES (2003); e Paulo Renato Souza, 65, ministro da Educação de FHC e hoje secretário paulista da área, há algum tempo afastado da discussão econômica.
Três não quiseram revelar seu voto ou dar entrevista -Wilson Cano, 72, professor da Unicamp; João Manuel Cardoso de Mello, sócio da Facamp (Faculdades de Campinas); e Antonio Barros de Castro, que presidiu o BNDES (1992) e até há pouco assessorava a direção do banco (deixou o cargo por razão pessoal).
O último, Luiz Gonzaga Belluzzo, 67, está hospitalizado. Filiado ao PPS (parte da coalizão serrista), mas conselheiro de Lula, ele disse em agosto à agência Reuters que tinha "dificuldade de escolher entre os dois".

ATAQUE AOS JUROS
Mesmo divididos na eleição, todos foram e são críticos da política monetária de FHC e Lula: defendem redução maior dos juros e temem o impacto do real valorizado na indústria nacional e nas contas externas.
Lessa, padrinho de casamento de Serra, diz que prefere o tucano por temer que Dilma mantenha Henrique Meirelles, seu velho desafeto, na direção do BC.
Dilmistas acham que o tucano mudou de lado. "Dilma é progressista. Serra ficou num partido que se chama social-democrata e é contra todas as teses da social-democracia", diz Conceição Tavares. Cano, que deixou o PT em 2002 e não revela o voto, acha que Serra "está no partido errado".
Outra restrição é ao suposto "fiscalismo" do tucano, embora ele agora pregue aumento do salário mínimo em 2011 maior do que o proposto pela equipe lulista.
O argumento é que o discurso do corte de gastos é senha para a defesa do Estado mínimo.
"A crítica de Serra é à hegemonia do BC. Não é cortar gastos, é ter uma política fiscal que apoie a queda dos juros", discorda Salm. "A direita não apoia Serra. O mercado financeiro apoia Dilma", acusa. "Serra é um nacionalista", completa Lessa.

ONTEM E HOJE
O desenvolvimentismo não é hoje o mesmo dos anos 1950, início da industrialização. A economia está internacionalizada e a necessidade de manter a inflação sob controle foi absorvida pelos cepalinos. Mas, em relação a rivais ortodoxos (ou liberais), há ênfase na ação do Estado -e dos bancos públicos- e na distribuição de renda.
Junto às derivações da teoria keynesiana, o guarda-chuva cepalino abriga do presidente do Ipea (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas), Márcio Pochman, ao ex-ministro de FHC Bresser Pereira, um "neodesenvolvimentista".
Eleitor de Dilma, o economista da UFRJ Fábio Sá Earp diz que nem os embates entre cepalinos e ortodoxos são os mesmos. "Nos industrializamos, depois nos estabilizamos. Houve um amadurecimento e estamos condenados a pequenos debates. Os liberais afrouxaram, ninguém mais fala em privatizar a Petrobras."
Wilson Cano diverge: "O domínio do pensamento antiestatista não acabou. Estamos há 20 anos com políticas de corte neoliberal. Há individualismo, consumismo exacerbado, coisas que tiram o foco do coletivo".


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