São Paulo, segunda-feira, 27 de setembro de 2010

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Saúde eleitoral

"Vitrines" de Serra e Dilma na área têm realidades diferentes da propaganda na TV

Trunfos eleitorais de José Serra (PSDB) e Dilma Rousseff (PT), os AMEs (clínicas com médicos especialistas) e as UPAs (prontos-socorros) não funcionam tão bem quanto suas propagandas mostram.
Em SP, em alguns AMEs faltam profissionais -há dificuldade para encontrar médicos especialistas no interior. Em outros, sobram vagas -diante da ociosidade, alguns AMEs resolveram ampliar a região de cobertura planejada.
No Rio, as UPAs estão abarrotadas. Têm fila até para entrar. Os pacientes precisam esperar do lado de fora, ao ar livre. Não há nem sequer senha.

VITRINE DE DILMA

Unidades enaltecidas por petista têm fila para entrar na fila no Rio

HUDSON CORRÊA
DO RIO

Colocadas na vitrine das propostas de Dilma Rousseff (PT) para a área de saúde, nem todas as UPAs (Unidades de Pronto Atendimento) 24 horas são "uma coisa limpa", onde não "tem fila de espera", como disse o presidente Lula ao inaugurar uma unidade em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, no final de agosto.
Quem procura a UPA da Penha, zona norte do Rio, administrada pelo governo estadual, é informado que deverá aguardar do lado de fora da unidade. Lá, 30 cadeiras colocadas em um terreno de areia servem de "sala de espera" para os pacientes.
A reportagem esteve no local no dia 14 passado. Uma galinha ciscava entre os pés das pessoas que aguardavam atendimento. Não havia distribuição de senhas. O recém-chegado precisava perguntar quem era o último da fila e se entender com eles.
Ao menos dez pessoas estavam em pé, pois faltavam assentos sob o toldo branco. Alguns aguardavam acomodados ao pé de árvores ou em dois bancos de madeira.
Três dias depois, a reportagem voltou à UPA e encontrou Janaina Larissa Santana, 17, sentada em um banco de madeira com seu bebê de quatro meses no colo. Eram 10h, e Janaina contou que havia chegado ao local à meia-noite com o filho com 39 graus de febre.
Voltadas para o atendimento de casos de emergência, as UPAs foram criadas no Rio pelo governador Sérgio Cabral (PMDB) em 2007. Adotadas como projeto nacional na área de saúde, o governo federal passou a liberar dinheiro para novas construções pelo Brasil.
O governo quer construir 500 unidades (ao custo de R$ 1 bi) até o fim do ano. A administração deve ficar com governos ou prefeituras. Mas Lula está longe do objetivo. Até quinta-feira passada, 84 UPAs haviam sido inauguradas em todo o país. Dilma, se eleita, assumiria o compromisso de atingir a meta.
Ao inaugurar a unidade de Nova Iguaçu, Lula afirmou que, além de não ter fila, nas UPAs a "pessoa é tratada pela gravidade da doença".
A reportagem também esteve na UPA de Irajá. Zélia Barroso, 57, disse que chegou às 8h ao local e chorava indicando dor nas costas.
"Ela não chegou a ser atendida. Foi atendida na classificação de risco às 8h57, mas, quando foi chamada, às 10h10, não estava mais na unidade, tinha deixado o local", informou a secretaria. A Folha fez foto dela chorando de dor. Eram 14h.
Sobre as filas nas UPAs, a secretaria estadual de Saúde informou que "os pacientes que necessitam de atendimento mais simples (...) acabam realmente esperando um pouco mais". Afirmou ainda que "paciente nenhum deixa de ser atendido".

VITRINE DE SERRA

Faltam médicos e sobram vagas em rede divulgada por tucano

RICARDO WESTIN
DE SÃO PAULO

Nos 34 AMEs (Ambulatórios Médicos de Especialidades) de São Paulo, bandeira eleitoral de José Serra (PSDB) na saúde, não se veem filas nem salas de espera abarrotadas. Os doentes só chegam com hora marcada.
Essas policlínicas oferecem consultas com cardiologistas, neurologistas, oftalmologistas e outros médicos especializados. E realizam exames de diagnóstico que vão além do raio-X básico, como ressonância, endoscopia e eletroneuromiografia.
Em algumas cidades, os AMEs também fazem pequenas cirurgias -de hérnia ou catarata, por exemplo.
Os AMEs têm no máximo três anos. Estão, portanto, novinhos. Pintura impecável e ar-condicionado em ordem.
Eis, por fim, o SUS (Sistema Único de Saúde) funcionando às mil maravilhas? Não chega a tanto, dizem secretários de Saúde de municípios atendidos por AMEs.
Eles, que falaram à Folha sob a condição de não serem identificados, reconhecem que as policlínicas de Serra ajudam a aliviar a carência de médicos especialistas no SUS e a desafogar os centros cirúrgicos dos hospitais.
No entanto, apontam uma falha: falta sintonia com o restante da rede pública.
Os casos da costureira Lídia Prata Batista, 56, e do pedreiro Antônio Pereira da Silva, 58, ilustram o que os secretários querem dizer.
A Folha encontrou os dois pacientes no AME Heliópolis, na zona sul de São Paulo.
A costureira, que é de Mairiporã e será operada da vesícula, fez todos os exames no AME. Como aquele ambulatório não realiza a cirurgia, foi encaminhada dali para um hospital público. A operação será em junho de 2011.
Já o pedreiro, que mora no Guarujá, fazia exames de próstata. Tem um tumor. Antes de chegar ao AME, havia sido transferido de posto de saúde em posto de saúde. O jogo de empurra atrasou o diagnóstico em um ano.
"O Estado deveria investir não só nos AMEs, mas também ajudar as redes municipais de saúde para que ofereçam a retaguarda adequada para os AMES", afirma um dos secretários de Saúde.
Outro problema decorrente da falta de sintonia com os municípios é a ociosidade em alguns AMEs.
Os secretários dizem que houve pouco diálogo com os municípios e que, por isso, as demandas de cada local foram mal calculadas pelo Estado.
A Secretaria de Estado da Saúde diz que há parceria com os municípios tanto na definição de especialidades como na identificação das demandas regionais.
Os 34 AMEs são administrados por entidades privadas sem fins lucrativos. Elas recebem dinheiro dos cofres estaduais para manter os serviços em funcionamento.


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