São Paulo, sábado, 31 de julho de 2010

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CLAUDIO WEBER ABRAMO

Candidatos omitem combate à corrupção


Presidenciáveis não revelam disposição para mudar regras do sistema político


A PREDOMINÂNCIA da projeção de imagem sobre a substância (algo que não é exclusivo da política, num país em que, em todos os campos e sem exceção, a conversa fiada é sempre mais valorizada do que a realidade) torna programas de governo de candidatos peças quase descartáveis.
Ainda assim, a leitura desses documentos às vezes revela algo sobre os candidatos. É o caso do combate à corrupção.
Tomando-se os três principais pretendentes à Presidência da República (José Serra, Marina Silva e Dilma Rousseff), o primeiro não tem nenhuma palavra a dizer sobre o assunto.
Serra ainda não tem um programa de governo; alguns temas genéricos (cultura, saúde, educação etc.) são citados em pequenos textos publicitários. Até agora, o candidato nada teve a dizer sobre as disfuncionalidades institucionais e gerenciais que levam à corrupção.
Dilma Rousseff, por seu lado, menciona apenas que promoverá "o prosseguimento, por meio da Controladoria-Geral da União, da AGU e da Polícia Federal, de ações de combate à corrupção". Ou seja, chove no molhado. Curioso seria se propusesse que tais entes deixassem de combater a corrupção. Não há uma palavra sobre a alteração das causas da corrupção. Há, sim, a identificação de uma causa fictícia para o fenômeno, a saber, o financiamento privado de campanhas eleitorais.
Dilma compartilha essa visão com a candidata Marina Silva. Como consequência, ambas declaram-se partidárias da proibição das doações privadas como método de combate à corrupção, sem que dediquem uma só palavra à explicação do inexplicável, ou seja, como uma coisa se relacionaria com a outra.
A única candidata cujo programa aborda o tema da probidade na administração pública com alguma atenção é Marina. É pena que demonstre compreensão limitada sobre o problema, o que a induz a atirar no alvo errado. Ao tratar de uma das principais causas da corrupção, que é o aparelhamento do Estado, propõe "reduzir drasticamente o número de cargos comissionados ocupados por quem não é servidor público".
Acontece que, no governo federal, já é assim. O porcentual de cargos de confiança ocupados por gente de fora das carreiras públicas tem diminuído com o tempo, num processo que começou no governo FHC e se intensificou no governo Lula. Isso não significa que os detentores desses cargos deixem de ser agentes políticos.
Servidores concursados ou não, eles são nomeados pelos partidos como parte do loteamento administrativo que sustenta a coligação de governo. Isso resulta em verdadeira usina de corrupção, porque os nomeados não trabalham para nós, mas para quem os nomeou.
O problema é a imensa quantidade de gente que o presidente, o governador, o prefeito podem nomear, e não a origem funcional dos nomeados. Marina não percebeu isso, mas tem tempo de mudar.
Quanto a Serra e Dilma, é inacreditável desconhecerem como a usina funciona. O fato de não mencionarem o tema mostra que, ao menos até o momento, não se dispõem a alterar as regras desse jogo. Ou talvez porque, se o fizessem, perderiam a única moeda de troca de que de fato dispõem na negociação com os partidos de suas respectivas coalizões.


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