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Folia de Reis cresce como última tradição caipira

Festa que mistura cultura e fé católica resiste em todos os Estados do país

No Brasil desde o tempo colonial, festejo hoje tem foliões morando na cidade e é realizado com hora marcada

JULIANA COISSI
DE RIBEIRÃO PRETO

Baltazar se lembra de uma época em que meninos de 12 anos eram tirados da cama de madrugada pelos pais. Na Fazenda dos Coxos, em Igarapava, à beira do rio Grande, ninguém da família podia faltar para a reza e a cantoria em volta do presépio.

Quem puxava o canto eram homens e mulheres ornamentados com fitas e roupas coloridas, tendo à frente o símbolo dos Santos Reis.

Hoje, aos 54 anos, é o mesmo Baltazar Aparecido Alves quem repete o ritual de Folia de Reis herdado do avô.

O chão de terra do sítio, porém, deu lugar ao asfalto das ruas de Ribeirão Preto. E a visita às casas é de dia. Com hora marcada.

Em pleno século 21, a Folia de Reis -festejo de origem católica existente no Brasil desde a colonização (século 18)- pode ser considerada a última tradição caipira, presente em todos os Estados, que resiste no interior do país.

"Essa Folia de Reis continua porque ainda existe um interior do Brasil muito caipira, de relações pessoais", afirma Pedro Paulo Funari, docente da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), especialista em cultura imaterial.

Para Funari, apesar do avanço dos tempos, a tradição não só se preserva como também cresce no país. Ele diz haver mais grupos de Folia de Reis no Brasil hoje do que dez anos atrás.

Não existe um levantamento nacional preciso, mas eram aproximadamente 3.700 grupos de Folia de Reis no ano 2000 só na região Sudeste, segundo estimativa do pesquisador carioca Affonso Furtado da Silva, autor do livro "Reis Magos - História, Arte e Tradições".

Para ele, iniciativas do poder público ou da sociedade -como a criação de festivais de Folia de Reis- é fundamental para manter viva a tradição. "É uma manifestação popular que, se não tiver apoio, vai se extinguindo."

Hoje, em Ribeirão, acontece a 20ª edição do Encontro Nacional de Folia de Reis, que deve reunir até 55 companhias de todo o país.

HORA MARCADA

Para se adaptar aos novos tempos, a Folia de Reis foi trazida com os sitiantes que se mudaram para a cidade.

Em Ribeirão, dos oito grupos existentes, sete são de pessoas que moram nos bairros, na zona urbana, como Benedito de Paula Vale, 62, festeiro da Companhia de Reis Irmãos Vieira. Como os demais grupos, os foliões só visitam quem liga para agendar.

"Antigamente todo mundo te recebia. Mas hoje muita gente mudou de religião. Se chegar de surpresa, alguns até te xingam", disse.

Mas ainda existem grupos à moda antiga em cidades menores, como Itaú de Minas (MG), conta o folião Sebastião Reis da Silva, 75. "Aqui a gente sai sem marcar nada. Vai cantando e o pessoal que gosta abre a porta para a gente."

Mais do que uma festa popular, foliões modernos ou os tradicionais se unem por um ponto: a fé. "O que importa é a devoção. Falar [da festa] só na base de cultura, a gente acaba até se ofendendo", conta Baltazar Alves, da Companhia de Reis Irmãos Adolfo.

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