Ribeirão Preto, Segunda-feira, 17 de Agosto de 2009

Próximo Texto | Índice

"Rejeitados", vagões de trem viram sucata

Abandonados em São Carlos e Barretos, eles passaram a ser usados para tráfico, esconderijo de fugitivos e prostituição

Associação ferroviária diz que eles não interessaram aos vencedores da privatização de 1998 e, por isso, foram descartados

Márcia Ribeiro/Folha Imagem
O empreiteiro Paulo de Freitas, que mora com 22 funcionários em vagões de trens abandonados na estação ferroviária de São Carlos

JEAN DE SOUZA
ENVIADO ESPECIAL A SÃO CARLOS

Rejeitados no processo de privatização das ferrovias brasileiras, há mais de dez anos, vagões de trens abandonados se tornaram um amontoado de sucatas incômodo para moradores de São Carlos e Barretos.
Nas cidades, queixas de que os vagões são usados para consumo e tráfico de drogas, como esconderijo para fugitivos e locais de prostituição são um reflexo da insegurança gerada por eles, que já simbolizaram o progresso de cidades do interior no século passado.
Em São Carlos, as dezenas de vagões de carga enfileirados se perdem em meio ao mato alto. Eles foram deixados no pátio atrás da antiga estação da cidade, onde hoje funciona um órgão cultural da Prefeitura de São Carlos. Vizinho do local, o assessor contábil Renan Lobato, 20, disse que ali é comum a presença de usuários de drogas, o que acaba por atrair também traficantes. Para ele, pessoas que se abrigam no local também são um problema. "À noite, ninguém passa por ali."
Em junho, um morador de rua foi morto na área do antigo pátio ferroviário por outros dois moradores de rua.
Autor de um requerimento que pede a retirada dos vagões, o vereador Antonio Carlos Catharino (PTB) coleciona notícias de crimes como furtos, roubos e agressões cometidos nos arredores da antiga estação. "Como é que transformam uma cidade num depósito de vagões abandonados?", questiona o vereador. Uma das medidas urgentes defendidas por ele é, ao menos, o corte da grama que cerca os vagões.
Situação parecida é vivida por moradores da área da Colônia Fepasa, próxima à antiga estação ferroviária de Barretos e também de um terreno onde cerca de 20 vagões foram deixados. "Aquilo lá serve para o pessoal usar droga. A gente tem medo, porque pode trazer perigo para nossa casa", disse o pedreiro Mário Fidélis, 52.
Além da insegurança, ele cita outros riscos: "tem alguns deles [vagões] que estão caindo. As crianças brincam lá e podem se machucar."
Segundo Geraldo Godoy, assessor da ABPF (Associação Brasileira de Preservação Ferroviária), os vagões não interessaram às empresas que ganharam a concessão dos serviços ferroviários na privatização de 1998. Por isso, foram analisados e descartados. A inscrição "devolver" em cada um mostra a decisão que lhes conferiu um destino incerto.
O reaproveitamento de alguns desses equipamentos é improvável. A característica das principais cargas transportadas na região -álcool e grãos- dispensa vagões de carga como os de São Carlos e Barretos. Além disso, os "rejeitados" têm capacidade menor do que os usados hoje pelas empresas.
Segundo a legislação que extinguiu a Rede Ferroviária Federal, esses vagões, assim como os bens da antiga estatal não incorporados na privatização, devem ser inventariados e repassados a outros órgãos, como o Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura Terrestre). Esses órgãos devem leiloá-los ou reaproveitá-los -no caso das estações, podem se transformar em museus.
O processo, porém, é burocrático. A Folha entrou em contato com a inventariança da extinta Rede Ferroviária Federal S. A., que não soube informar quando os vagões serão removidos. A orientação foi procurar o Dnit, que recomendou, por sua vez, contatar a inventariança. No órgão, de novo disseram não ter informações.


Próximo Texto: Ribeirão prevê usar acervo para instalar Museu do Trem
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.