São Paulo, segunda-feira, 07 de junho de 2010

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Dinâmica de grupo

Aprendizagem baseada em problemas, que estimula o debate entre alunos, ganha espaço em cursos de saúde

JULIANA VAZ
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

O professor largou o giz e desceu do púlpito. Agora, senta-se ao lado dos pupilos e, de preferência, fica de boca fechada. São assim as aulas em cerca de 50 faculdades no país -principalmente em cursos na área de saúde.
Há pouco mais de uma década, as escolas passaram a adotar metodologias ativas de ensino, e uma delas, a aprendizagem baseada em problemas -ou simplesmente ABP- é tendência em cursos criados recentemente.
Nas faculdades que usam esse método, os alunos não têm aulas expositivas, mas aprendem por um processo semelhante às dinâmicas de grupo das empresas, em que uma turma de cerca de dez alunos deve resolver um problema, que pode ser extraído do cotidiano de um hospital.
Para solucioná-lo, os estudantes levantam hipóteses em conjunto, e, individualmente, partem para a pesquisa. Em um próximo encontro, o grupo tira conclusões.
Em sintonia com essa dinâmica, a função do professor não é dizer o que é certo ou errado, mas, no papel de tutor, apenas estimular e moderar o diálogo.
"Nós dizemos para os professores perderem a vontade de ensinar e deixarem que os alunos errem. Eles aprendem no erro", afirma Hissachi Tsuji, professor da Faculdade de Medicina de Marília, uma das pioneiras no uso da ABP no Brasil.
"Mesmo que você ensine tudo hoje, pode ser que o conhecimento mude. O profissional deve continuar se atualizando. Isso significa aprender a aprender", diz.
Além de debates, alunos têm, desde o primeiro ano, atividades práticas em casas de saúde e conferências interdisciplinares que visam uma formação abrangente, que extrapole a medicina. Um sociólogo, por exemplo, pode abordar a obesidade a partir dos preconceitos sociais associados à ela.

HIBRIDISMO
O uso da ABP nas faculdades de medicina encontra respaldo nas diretrizes curriculares instituídas pelo Ministério da Educação em 2001. De acordo com elas, os cursos devem "utilizar metodologias que privilegiem a participação ativa do aluno".
Algumas faculdades, como as de medicina da UFSCar e da UEL (Universidade Estadual de Londrina), usam a ABP em toda a graduação. Outras escolas não abrem mão das aulas expositivas como forma de sustentação teórica e adotam um currículo que mistura metodologias.
É o caso do curso de engenharia biomédica da PUC-SP, inaugurado em 2009, e da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP Leste, aberta em 2005, que adota a resolução de problemas no ciclo básico -comum aos dez cursos do campus.

ADAPTAÇÃO
Afeitos à decoreba, alunos que saem do ensino médio precisam se acostumar à ABP, que requer disciplina e autodidatismo.
"É difícil no começo. Você se pergunta: "Será que estudei o suficiente?" Mas, no desenrolar do curso, o que você não conseguiu estudar será revisto. As amarras vão sendo feitas", diz Rafael Rosa, 24, aluno do 3º ano de medicina na UFSCar.
Já Ivan Castrucci, 21, não conseguiu se adaptar ao método. Ele desistiu de cursar medicina na Unicid (Universidade da Cidade de São Paulo), faculdade que usa a ABP, ao final do primeiro ano.
Hoje, faz cursinho para entrar em uma faculdade com aulas tradicionais.
"Quanto mais você fala, maior a nota. Eu via competição nas discussões. Não conseguia falar e aí fui me complicando", conta.


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