São Paulo, segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

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Escolas exigem que alunos escrevam à mão

Objetivo é evitar que, com o uso frequente do computador, no colégio e em casa, os estudantes percam a caligrafia e deixem de atentar para as normas cultas

Pesquisadora, entretanto, critica exigência, que encara como um retrocesso, já que diz que trabalhos manuscritos serão muito raros no futuro

Leticia Moreira/Folha Imagem
Letícia Martins, 15, leva o computador para a escola para anotar os conteúdos das aulas

TALITA BEDINELLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Os livros e cadernos que Letícia Martins e Pedro Paulo dos Santos, ambos de 15 anos, levam na mochila ganharam em 2009 a companhia de um notebook. É no computador que eles anotam o conteúdo das aulas do colégio Sidarta (em Cotia, na Grande São Paulo).
Depois de sair da escola, os dois ainda acessam a internet para se comunicar com os amigos. O resultado é que escrevem cada vez menos à mão, assim como muitos de seus colegas.
Com medo de que os avanços tecnológicos façam com que os estudantes percam a caligrafia e deixem de atentar para as normas cultas da escrita, escolas particulares intensificaram a produção de redações e ainda pedem que a maioria dos trabalhos seja manuscrita.
No Santa Cruz (zona oeste de SP), por exemplo, os alunos até podem fazer o trabalho no computador, mas, antes de entregá-lo, devem transcrevê-lo à mão. É o que Alejandro Gabriel Miguelez, coordenador do curso de produção textual do colégio, chama de "passar a sujo".
"A expressão é uma brincadeira que faço com os alunos. Não abrimos mão do texto manuscrito, é preciso que eles pratiquem a caligrafia."
Apesar do duplo trabalho, ele conta que muitos estudantes preferem escrever primeiro no computador para usar corretores ortográficos eletrônicos.
Para evitar esses "truques", algumas escolas, como a PlayPen (zona oeste) e o Augusto Laranja (zona sul), até aceitam trabalhos feitos no computador. Mas só as versões finais, depois de vários rascunhos serem corrigidos pelo professor e de não sobrar nenhum erro.
Há escolas, no entanto, que discordam desses métodos. O Sidarta, que libera o computador nas aulas, acredita que há outras formas de evitar que a tecnologia atrapalhe o aprendizado. Quando as palavras são grifadas pelo Word, por exemplo, o professor pede que os alunos procurem a forma correta no dicionário.
A pesquisadora Cristiane Dias, do Laboratório de Estudos Urbanos da Unicamp, também critica a exigência de textos manuscritos. Ela acredita que, no futuro, escrever à mão será muito raro.
"Desde que a comunicação passou da oralidade para a escrita, ela foi se modificando. Quando a escrita era a pena, existia um tipo de caligrafia que não existe mais. É possível dizer que perdemos?", diz. "As próximas gerações não vão ter essa preocupação. Para que obrigá-los a voltar para trás?"
Izeti Fragata, coordenadora de português do colégio Bandeirantes (zona sul), argumenta: "Os alunos têm de ter letra legível. No vestibular, os corretores não vão fazer esforço para entender o que eles escreveram". Na escola, só trabalhos muito longos podem ser feitos no computador. Se um aluno entrega ao professor um trabalho com letra difícil de ler, tem de refazê-lo. Em provas, respostas ilegíveis são anuladas.


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