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Estudo liga câncer na boca a sexo oral com várias pessoas
Pesquisa concluiu que praticar com 4 ou mais parceiros triplica risco de ter o tumor
HPV, agora, está mais relacionado a lesões na língua e na amígdala; não há razões para pânico,
avisa especialista no vírus
RICARDO MIOTO
ENVIADO ESPECIAL AO RIO
Um vírus sexualmente transmissível e tradicionalmente ligado a câncer no pênis, ânus e
colo do útero está sendo relacionado cada vez mais, também, a tumores na boca.
A explicação para a maior
presença do HPV (papilomavírus humano) nos casos desses
cânceres é o aumento da prática de sexo oral nas últimas décadas, em especial entre jovens.
Em 2005, 55% dos garotos e
54% das garotas entre 15 e 19
anos já tinham experimentado
essa modalidade, segundo o
Centro Nacional de Estatísticas da Saúde dos EUA.
Nas décadas de 1940 e 1950, é
claro, os estudos de Alfred Kinsey, pioneiro no mapeamento
dos hábitos sexuais dos americanos, indicavam números bastante diferentes.
Apenas 10% dos homens e
19% das mulheres daquela época disseram ter praticado sexo
oral antes do casamento -apesar de menos de 50% das mulheres e de 33% dos homens terem casado virgens.
Com isso, se tornaram mais
frequentes, a partir do pós-guerra até hoje, os casos de câncer na base da língua, na amígdala e até em partes do pescoço,
que surgem a partir de lesões
causadas pelo HPV.
Essas conclusões estão em
um artigo de opinião publicado
em março no "British Medical
Journal" pela equipe do médico Hisham Mehanna, do Hospital Universitário de Coventry, no Reino Unido.
Aumento do risco
Ele relata um trabalho com
mais de 10 mil voluntários. A
conclusão: quem já tinha feito
sexo oral com quatro ou mais
pessoas tinha uma chance mais
de três vezes maior de ter câncer na orofaringe (que começa
na raiz da língua e vai até a faringe) do que quem não tinha.
Outro estudo citado por Mehanna foi feito na Suécia por
quase 40 anos. Ele envolveu
procurar pelo HPV em biópsias
de tumores retirados da orofaringe. Nos anos 1970, o vírus foi
encontrado em apenas 23% dos
tumores. Em 2006 e 2007, foi
achado em 93%.
Como o número de casos de
câncer na orofaringe está crescendo, e não diminuindo, é possível concluir que o HPV nunca
antes causou tantos tumores
na boca e adjacências.
Sem neurose
Não há motivo, porém, para
desespero, diz a médica Eliane
Pedra Dias, da Universidade
Federal Fluminense.
Ela deu uma palestra sobre
lesões orais no Simpósio Internacional de HPV, organizado
na semana passada pela Fiocruz, no Rio. "É importante não
criar neuroses. Sexo é uma coisa que é para ser boa."
A maioria das pessoas serão
infectadas pelo HPV em algum
momento das suas vidas. E, em
geral, o vírus vai embora sem
deixar nenhuma lesão.
Segundo Dias, é importante
lembrar, também, que as pesquisas sobre a relação entre
HPV e câncer na boca não estão
totalmente consolidadas.
"Os mecanismos de infecção
ainda não são totalmente conhecidos. Embora também seja
uma mucosa como a genital, as
características do ambiente e a
resposta imune das duas regiões são bem diferentes."
"Mais pesquisas precisam ser
feitas", concorda Mehanna.
Já existem vacinas contra o
HPV. Ainda se discute se vale a
pena incluí-las no Programa
Nacional de Imunização. Ela é
cara (o valor chega às centenas
de reais por unidade) e os cientistas ainda questionam a
abrangência da sua eficiência.
Por enquanto, afirma Dias, o
mais importante são exames
periódicos na boca, porque as
lesões iniciais são pouco perceptíveis e o diagnóstico acaba
acontecendo quando o tumor
já está em estágio avançado.
"O médico olha direto para a
garganta e o dentista, apenas
para os dentes", brinca.
O jornalista RICARDO MIOTO viajou a convite da Fiocruz
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