São Paulo, segunda-feira, 09 de fevereiro de 2009

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"Eu senti na pele o que sente um viciado"

DA REPORTAGEM LOCAL

Leia, a seguir, o depoimento de um jovem de 28 anos, morador de São Paulo, que se arrepende de ter usado anabolizantes. Quem indicou a droga foi um médico.

 


"Nunca experimentei drogas ilegais, mas posso dizer que já senti na pele o que sente um viciado. Tive essa sensação quando usei um anabolizante que parecia ser perfeitamente seguro -comprado em farmácia e com receita médica.
No final do ano passado, procurei um médico especializado em atender frequentadores de academias de ginástica. Minha queixa: faço musculação há cinco anos e meus bíceps, tríceps e afins nunca "explodiram".
Ele me pediu exames de sangue, testes de urina e provas de esteira ergométrica. Duas semanas depois, voltei com os resultados. Tudo normal. Eu esperava um tratamento com algum suplemento qualquer à base de proteína, mas o médico prescreveu um "remédio que dá mais força e disposição". Era um anabolizante.

Vencer o medo
A palavra, por si só, assusta. Acabei vencendo meu medo com o seguinte argumento: estou sendo orientado por um médico e fiz todos os exames, então que mal haveria? E fui à farmácia para a primeira das quatro dolorosas injeções semanais.
Logo na manhã seguinte acordei cheio de pique para a academia. As cargas que eu levantava até então ficaram leves como por milagre. Se puxava 12 kg, consegui puxar mais de 20 kg. Bastaram três dias para que meus braços ficassem mais grossos do que em anos de academia.
A sensação era ótima. Gostava de olhar no espelho e ver que estava ficando mais forte e mais bonito. Acordava já pensando na academia. E passava cada vez mais tempo lá dentro -quase quatro horas por dia, sete dias por semana. Pelos tipos físicos, percebi que pelo menos metade dos meus colegas de academia faziam uso frequente de anabolizante.

Lesão e queda de cabelo
Comecei a suar muito. A pele do rosto ficou oleosa. O cabelo passou a cair. Tive dificuldades à noite para dormir. Fiquei agitado a ponto de não poder me concentrar no trabalho. Mesmo assim, eu considerava os benefícios do anabolizante maiores que os efeitos colaterais.
Só comecei a me dar conta de que algo estava indo mal quando sofri uma lesão no braço por excesso de peso e quando percebi que, com o cabelo rareando cada vez mais, logo teria buracos na cabeça.
A gota d'água foram as férias. Com várias viagens marcadas, como eu conseguiria me exercitar durante aquelas quatro semanas? Foi um pânico. Como um drogado, eu já previa minha síndrome de abstinência. Cogitei a hipótese de passar as férias em São Paulo só para não ficar sem academia.
Tudo isso ocorreu em apenas três semanas. Com ajuda de um amigo, decidi não tomar a terceira das quatro doses. Em pouco tempo, mesmo indo à academia, meu corpo voltou a ser praticamente igual a antes. Os músculos murcharam.
Estou feliz por ter conseguido deixar os anabolizantes. Sei que nem todos conseguem. Mas tenho muito medo do que pode acontecer no futuro à minha saúde por causa de um médico irresponsável e de um desejo fútil de mudar a aparência."


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