|
Próximo Texto | Índice
Ultrassom agora é festa
Exame que acompanha o crescimento do feto e detecta eventuais anomalias vai à casa da gestante e vira pretexto para evento social; médicos criticam banalização do uso do aparelho em 4D
Marisa Cauduro/Folha Imagem
|
|
Fabiana Borges, 31, passa pelo ultrassom 4D em sua casa, na presença do médico Renato Morgado e dos amigos e vizinhos Rodrigo e Margareth, e da filha deles, Giulia
CAROLINA LEAL
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Quando engravidou pela segunda vez, a gerente de vendas
Érika Szmoisz reuniu em casa
tios, avós, marido e babá, e fez
ali mesmo seu primeiro ultrassom em quatro dimensões.
Dividiu o custo do exame delivery com a família e não tem
dúvida: diz que se tiver outro filho, fará a mesma coisa.
O ultrassom 4D -que, em
vez de gerar fotos, faz um vídeo
da criança em movimento- está se tornando tão popular nas
clínicas que algumas, para se
diferenciar, começam a oferecer os serviços em domicílio.
Assim, a grávida pode reunir
a família inteira e chamar quem
ela quiser, na hora do exame,
para exibir seu bebê.
A clínica Ávila e Toledo, na
cidade de São Paulo, atende em
chás de bebê e festas de família
como a de Érika.
Mas a comodidade tem seu
preço: o atendimento em casa
custa R$ 2.000 no fins de semana e feriados e R$ 1.500 de segunda a sexta-feira. Quando o
ultrassom é feito na própria clínica, o preço cai para R$ 300.
"A gente percebeu que havia
um mercado grande para trabalhar", diz Telma de Oliveira,
sócia da clínica.
Fabiana Sebergas Pinhal,
grávida de 34 semanas, é uma
das gestantes que se animou a
fazer o ultrassom 4D no chá de
bebê. Acabou desistindo da
ideia porque resolveu transferir a festa para Minas Gerais, na
casa de parentes.
Mas acabou ganhando da clínica o exame domiciliar, em
São Paulo. "Em casa, você pode
ficar à vontade e o tempo que
eles disponibilizam para o exame é maior", diz.
Produção fotográfica
Já a Photobaby, especializada em ultrassom 4D, pretende implantar o atendimento
domiciliar em junho. Por enquanto, faz entre cem e 150
exames por mês, na própria clínica. Lá, é permitido levar a família toda para a sala do ultrassom e o atendimento é aos sábados, para não coincidir com o
trabalho da plateia.
A clínica também tem convênio com uma produtora e dá
desconto se a gestante decide
fazer um ensaio fotográfico. "A
produtora faz a foto de fora e a
gente faz a foto por dentro",
brinca Daniela Figueiredo, dona da clínica. Detalhe: o exame
não inclui diagnóstico médico.
"A mãe assina um termo sabendo que é só a foto", diz.
Bruna Jorge, que acabou de
ter a segunda filha, começou a
fazer o ultrassom 4D na Photobaby com sete semanas de gravidez. Disse que perdeu a conta
dos exames fez. Professora,
além de mostrar os vídeos para
a família, os levou para seus
alunos do ensino fundamental.
Médicos obstetras ouvidos
pela reportagem divergem
quanto a esse uso desregrado
do ultrassom.
Para Eduardo Souza, coordenador científico de ginecologia
e obstetrícia da unidade Amália
Franco do Hospital São Luiz,
não há problema em a gestante
fazer vários exames, mesmo
que por conta própria.
A única recomendação do
médico é que ela mantenha a
consulta pré-natal e faça o ultrassom 4D apenas a partir de
30 semanas de gravidez. "Daí
ela já consegue ver algumas feições do bebê, fica um exame
mais agradável".
Já para o obstetra Sérgio
Kobayashi, chefe do setor de
medicina fetal do Hospital Sírio-Libanês, o exame só deveria
ser feito com recomendação
médica, para complementar o
ultrassom tradicional, em casos específicos.
Mas, segundo ele, o apelo comercial do exame 4D é muito
grande. "A gente não sabe exatamente a longo prazo quais
são os efeitos do ultrassom sobre o feto. Até hoje, não existe
uma comprovação científica de
que o exame é 100% seguro."
Para o ginecologista e obstetra Eduardo Motta, do Hospital Israelita Albert Einstein, a
discussão não é sobre os efeitos
negativos no bebê, que seriam
nulos, mas sobre a banalização
do ultrassom e sua transformação em espetáculo.
"Passa-se a ideia de que fazer
ultrassom 4D é fundamental
para a avaliação de bem-estar
do bebê. É uma ideia errada,
que acaba sendo incentivada
por celebridades que até compram aparelhos de ultrassom."
Foi o que fez, por exemplo, a
cantora Ivete Sangalo. A atriz
norte-americana Katie Holmes
é outro exemplo de famosa que
comprou o aparelho quando
estava grávida.
No Brasil, resolução do Conselho Federal de Medicina determina que só médicos realizem e interpretem exames.
Próximo Texto: Frases Índice
|