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USP testa estímulo cerebral em viciados
Psiquiatras aplicam ondas magnéticas em regiões específicas do cérebro para tratar dependentes de cocaína
Técnica, já usada contra
depressão, difere da
eletroconvulsoterapia,
em que o cérebro recebe
uma descarga elétrica
FERNANDA BASSETTE
DE SÃO PAULO
Pesquisadores do Instituto
de Psiquiatria da USP estão
testando o uso da estimulação magnética do cérebro para conter a fissura de pessoas
dependentes de cocaína em
pó e "reorganizar" o funcionamento cerebral.
A técnica, chamada estimulação magnética transcraniana, é usada aqui desde
2006 no tratamento de depressão. Segundo os médicos, não é invasiva e quase
sem efeitos colaterais.
Essa é a primeira vez que
pesquisadores brasileiros resolvem investigar se os benefícios do método podem ser
estendidos para dependentes crônicos da droga.
Um grupo de Israel, por
exemplo, estudou os efeitos
da estimulação contra a fissura provocada pelo tabaco.
Os resultados mostram uma
queda no desejo pela droga
nos primeiros três meses.
Segundo o último levantamento da Senad (Secretaria
Nacional de Políticas Antidrogas), 2,9% da população
brasileira já usou cocaína ao
menos uma vez na vida. E
7,7% dos universitários experimentaram a droga ao menos uma vez.
O psiquiatra Phillip Leite
Ribeiro, responsável pelo
teste na USP, explica que a
ação da cocaína desorganiza
os circuitos cerebrais, alterando o funcionamento das
redes de neurônios. "A consequência é uma pessoa dependente da cocaína, com dificuldade de raciocínio e de
decisão", diz Ribeiro.
COMO FUNCIONA
A estimulação magnética
transcraniana é aplicada em
consultório, sem anestesia.
O paciente usa uma touca
de natação e o médico aproxima o aparelho na região do
cérebro a ser tratada. As ondas penetram cerca de 2 cm.
No caso da cocaína, o local
exato da aplicação não foi divulgado por se tratar de algo
ainda em estudo. As sessões
são feitas durante 20 dias e
duram 15 minutos. Custam,
em média, R$ 400 cada uma.
Após um mês, o paciente
faz tratamento para prevenir
recaídas. Por enquanto, os
resultados preliminares mostram que há, de fato, uma diminuição na fissura.
E, ao contrário do que parece, a estimulação magnética não provoca choques. É
bem diferente da eletroconvulsoterapia -método em
que o cérebro recebe uma
descarga elétrica generalizada, entrando em convulsão.
"A estimulação transcraniana gera um campo magnético com uma pequena
corrente elétrica. A ação é local", afirma Ribeiro.
POUCO USADA
Segundo Paulo Silva Belmonte de Abreu, chefe do
serviço de psiquiatria do HC
de Porto Alegre e presidente
da Associação Brasileira de
Estimulação Magnética
Transcraniana, embora seja
reconhecida, a técnica não é
muito usada no país.
"Ela tem efeitos positivos
na depressão, em psicoses
que provocam alterações auditivas [como esquizofrenia],
no tratamento da dor fantasma. Mesmo assim, poucos
centros a usam, ainda tem
muito preconceito", avalia.
Para Abreu, é importante
que o método seja testado para tratar outros problemas.
"É uma ferramenta não invasiva que não lesa o cérebro.
Quando não atinge os efeitos
desejados, ela não faz mal."
Segundo Abreu, a única
contraindicação é para pessoas com histórico de convulsão -a aplicação pode
desencadear uma crise. Os
principais efeitos colaterais
são leve dor local e desconforto durante a aplicação.
O psiquiatra Dartiu Xavier
da Silveira, diretor do Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes da
Unifesp, é mais cauteloso.
"É uma técnica que está
sendo estudada para vários
tipos de transtornos, mas
não é totalmente eficaz. O
que se sabe é que ela modifica circuitos neuronais, mas
ainda não é possível dizer
que resolve o problema", diz.
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