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Estatina não é para todos, dizem médicos
Cardiologistas brasileiros reconhecem os benefícios da droga para pessoas com colesterol normal, mas pedem cautela
Estudo com 18 mil pessoas sugere que o remédio reduz em 44% o risco de doença cardiovascular em pessoas sem colesterol elevado
FERNANDA BASSETTE
FLÁVIA MANTOVANI
DA REPORTAGEM LOCAL
Cardiologistas brasileiros reconhecem os benefícios do uso
de estatinas para prevenir
doenças cardíacas em pessoas
com colesterol baixo, mas dizem que não deve ser feita uma
prescrição indiscriminada desses medicamentos. Um estudo
apresentado anteontem nos
EUA sugeriu que esse remédio,
até então usado só em pacientes com colesterol alto, reduz
em 44% o risco de problemas
cardiovasculares em pessoas
com níveis normais ou baixos
de colesterol -mas que têm índices elevados de uma proteína
chamada C-reativa, ou PCR.
Os resultados tiveram grande repercussão no congresso da
American Heart Association,
onde foram apresentados. A
proteína PCR é um indicador
de inflamação, que pode resultar em doenças cardíacas.
O estudo, chamado Jupiter,
foi feito por dois anos com quase 18 mil homens com mais de
50 anos e mulheres com mais
de 60 de 26 países e teve patrocínio da farmacêutica AstraZeneca, fabricante do medicamento rosuvastatina cálcica
(um tipo de estatina).
Para o cardiologista brasileiro Francisco Fonseca, um dos
autores da pesquisa, os resultados foram surpreendentes e
"muito acima do que poderia
ser previsto". Ele acredita que o
trabalho vá influenciar as novas diretrizes americanas previstas para 2009, mas diz que
sua transposição para a prática
não será automática.
Sobre efeitos indesejados,
como um aumento ocorrido
nos novos casos de diabetes, ele
afirma que foram pouco significativos diante dos benefícios.
Segundo ele, o remédio deve
ser tomado indefinidamente.
"Todos os estudos mostram
que, quando se suspende o tratamento, perde-se o benefício."
Já o cardiologista Antônio
Carlos Chagas, presidente da
Sociedade Brasileira de Cardiologia, diz que o tempo de uso
depende do organismo. "Algumas pessoas, quando interrompem a medicação, voltam a ter
problemas. Outras, não."
O cardiologista Marcelo
Sampaio, do Instituto Dante
Pazzanese, é cauteloso ao analisar os dados. Para ele, é preciso individualizar os casos. "Seria uma maravilha se não existissem efeitos colaterais. As estatinas podem causar dores
musculares e sobrecarga hepática. Isso precisa ser monitorado constantemente, e deve prevalecer o bom senso."
Na opinião de Sampaio, as estatinas poderiam ser recomendadas para pessoas que tenham
colesterol baixo, mas com antecedentes familiares ou outros
fatores de risco associados.
Outra questão a ser avaliada,
segundo um editorial que
acompanha a pesquisa, é o custo da expansão do uso do remédio. Uma caixa com 30 comprimidos de 20 mg de rosuvastatina cálcica (dose usada no estudo) custa cerca de R$ 150. O remédio não é distribuído pelo
SUS (Sistema Único de Saúde),
e ainda não se sabe se outras estatinas teriam o mesmo efeito.
Mudanças no Brasil
Segundo Chagas, o estudo
poderá mudar diretrizes sobre
tratamentos, mas não a curto
prazo. "Os médicos não podem
sair medindo a PCR e medicando todo mundo. A principal implicação do estudo é entender
que alguns pacientes podem
ser tratados preventivamente",
disse Chagas, que reforça a importância de manter medidas
como a perda de peso e a prática de esportes.
Para Sérgio Timerman, cardiologista do InCor (Instituto
do Coração do HC de São Paulo), as estatinas trazem muitos
benefícios se forem usadas com
parcimônia. Ele diz que não é
preciso exagerar -como um
médico que citou no congresso
que a droga é tão fantástica que
deveria ser adicionada às caixas
d'água-, mas que o remédio
vem mudando a história natural da doença cardiovascular.
"Toda droga tem sua relação
risco/benefício. Mas a prevenção primária [em quem não
tem histórico de doença cardiovascular] é cada vez mais importante. Se há um remédio
que protege, deve ser usado."
Segundo Chagas, um estudo
dessas proporções causa questionamentos e mudanças de
conceitos. "Mas ainda depende
de mais fatores científicos."
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