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Aspirina reduz risco de morte em casos de câncer colorretal
Estudo com 1.279 pacientes mostra que a associação da droga ao tratamento convencional diminuiu em 30% a mortalidade
A hipótese é que o remédio iniba uma enzima presente em dois terços dos tumores; pesquisas mais amplas são necessárias, dizem médicos
CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL
O uso regular de aspirina pode reduzir o risco de morte em
pacientes com câncer colorretal, revela estudo inédito publicado ontem no "Jama" (revista
da Associação Médica Americana). No Brasil, esse tumor é o
terceiro (em mulheres) e o
quarto (em homens) de maior
incidência, segundo o Inca
(Instituto Nacional de Câncer).
Pesquisas anteriores já haviam apontado que a aspirina
também diminui o risco de adenoma colorretal (tumor benigno), mas é a primeira vez que se
demonstra o impacto na sobrevida de pacientes com o câncer.
Além de analgésicos, os componentes da aspirina (ácido
acetilsalicílico) têm efeitos anti-inflamatórios e anticoagulantes. No câncer, a hipótese é
que a droga iniba uma enzima
(COX-2) presente em dois terços dos tumores colorretais.
O estudo americano acompanhou 1.279 pessoas com câncer
colorretal sem metástases (estágios 1, 2 e 3), que passaram
por tratamentos convencionais
(cirurgia e radioterapia associada ou não à quimioterapia).
Em 11 anos de seguimento, os
pacientes que tomaram regularmente a aspirina como droga coadjuvante tiveram 30%
menos risco de morrer em
comparação aos doentes que
não usaram o medicamento.
Os benefícios foram maiores
em doentes cujo tumor tinha a
expressão enzimática COX-2.
"Os resultados sugerem que a
aspirina pode influir na biologia dos tumores colorretais,
além de prevenir sua aparição",
disse o oncologista Andrew
Chan, da unidade gastrointestinal do Massachusetts General
Hospital (EUA), um dos líderes
do estudo. No entanto, o pesquisador ressalta que é preciso
mais pesquisa sobre os efeitos
da aspirina no câncer, incluindo testes com placebos.
O oncologista Auro Del Giglio, coordenador de oncologia
do hospital Albert Einstein, explica que há mais de dez anos
existem evidências de que pacientes portadores de polipose
intestinal, doença que frequentemente evolui para o câncer
colorretal, têm uma diminuição do número de pólipos após
o tratamento com aspirina.
Segundo Del Giglio, a enzima
COX-2, presente no tumor,
tem um papel importante no
processo de divisão celular e é
provável que a aspirina iniba
essa ação -o que explicaria a
diminuição na taxa de mortalidade apontada pelo estudo.
Na opinião de Samuel Aguiar
Júnior, cirurgião oncológico do
Hospital A.C. Camargo, é preciso investigar melhor como a aspirina age na redução da metástase do tumor e se há relação
com processo de coagulação e
agregação de plaquetas.
"Há muito mais coisas envolvidas do que a simples inibição
da [enzima] COX-2. É preciso
investigar essa complexa interferência das vias envolvidas nos
processos de inflamação e de
controle da metástase", diz ele.
Para Del Giglio, é possível
que a aspirina, barata e de um
perfil de toxicidade conhecido,
converta-se em uma nova droga-alvo direcionada para câncer colorretal. "E por uma mínima fração do custo das atuais
drogas-alvo direcionadas."
O oncologista Paulo Hoff, diretor-executivo do Centro de
Oncologia do Hospital Sírio-Libanês, afirma que o estudo é
muito importante por ser o primeiro a demonstrar que o uso
dos anti-inflamatórios não esteroides pode reduzir a chance
de recorrência do tumor.
"O único problema é que não
é uma terapia totalmente sem
riscos. Quando se toma aspirina regularmente, há chances de
úlcera e de sangramentos, por
exemplo. Agora, se o paciente já
tem indicação para tomar esse
remédio, na prevenção de
doença coronariana, por exemplo, é um benefício extra."
Os oncologistas, porém, avaliam que, como as conclusões
do estudo são retrospectivas
(observacionais), é necessário
confirmar os dados com estudos randomizados, duplo-cegos e controlados por placebo.
"A pergunta é: quem vai financiar um estudo confirmatório
de uma droga tão barata?",
questiona Del Giglio.
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