São Paulo, sábado, 13 de dezembro de 2008

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Brasil cria 1º soro para veneno de abelhas

Toxinas liberadas nas ferroadas afetam coração, rins e fígado; previsão é que soro seja liberado em 2009

AMARÍLIS LAGE
DA REPORTAGEM LOCAL

Pesquisadores brasileiros desenvolveram o primeiro soro contra veneno de abelhas. O produto, que está em fase de testes, é voltado para os casos de reação tóxica -quando o ataque dos insetos resulta em centenas de ferroadas. A cada cem ferroadas, 1 mg de veneno passa a circular no sangue. Embora a substância não seja letal na maioria dos casos, ela deixa seqüelas no coração, nos rins e no fígado, além do sofrimento que causa nos primeiros dias.
"O paciente fica até cinco dias na UTI, sofrendo. Meses após o ataque, apresenta nefrite [inflamação do rim], lesões no coração, sintomas parecidos com hepatite. Era preciso um soro para proteger essas pessoas", diz o bioquímico Mario Sergio Palma, pesquisador da Unesp (Universidade Estadual Paulista) e orientador do estudo, que também envolveu especialistas do Instituto Butantã e da USP.
Segundo Palma, estima-se que, ao longo de 2008, serão registrados de 10,5 mil a 12 mil acidentes com abelhas e vespas no Estado de São Paulo. Os dados, segundo ele, ainda são abaixo da realidade, devido à subnotificação. Há uma média de quatro a cinco casos de alta gravidade por mês no Estado.
O problema não se restringe à área rural, ressalta o bioquímico. "Formigas, vespas e abelhas estão se urbanizando muito depressa, já que o homem tem invadido seus espaços."
Até agora, as tentativas para criar um soro assim falharam, diz Palma, porque os testes buscavam avaliar os mesmos parâmetros usados para venenos de serpentes, escorpiões e aranhas. Assim, media-se sua ação contra sintomas como hemorragias e danos neurológicos -só que o veneno de abelha não causa esses problemas.
O primeiro passo foi determinar a composição do veneno de abelha. Até cinco anos atrás, só eram conhecidas cinco proteínas da substância. Nos primeiros três anos do estudo, foram identificadas mais de 200 proteínas. Isso permitiu a realização de ensaios específicos para monitorar os danos associados a essas toxinas.
Nos dois anos seguintes, o soro foi testado em animais. O veneno de abelha era injetado em cavalos, dos quais eram extraídos os anticorpos. Esse soro era avaliado in vitro para verificar sua ação sobre as toxinas.
O próximo passo é a aplicação do soro em pacientes, que deve ocorrer no Hospital Vital Brasil, em São Paulo, especializado no atendimento a vítimas de animais peçonhentos, ou no Hospital das Clínicas da USP. "A previsão é que o soro esteja disponível já em 2009", afirma Fábio Morato Castro, supervisor do serviço de imunologia clínica e alergologia do HC, que ajudou a criar o produto.

Alergia
O soro para veneno de abelhas não muda o tratamento de pessoas alérgicas às ferroadas desses insetos. Nesse caso, o problema não é quantidade de veneno, e sim a reação exacerbada do sistema imunológico. Para esses pacientes, a indicação após um ataque continuará sendo a aplicação de adrenalina, antialérgico e cortisona.
Castro, da USP, ressalta que esse tipo de paciente também pode fazer um tratamento para se curar da alergia. O procedimento consiste em injeções mensais por três anos. A medida é eficaz em 90% dos casos.
A proporção de pessoas alérgicas a veneno de abelha varia conforme a etnia. No Brasil, devido à miscigenação, vai de 0,4% (pele mais escura) a 4% (pessoas mais claras).
A reação ao ataque pode incluir inchaço, sudorese, taquicardia, diarréia e edema de glote e pode levar à morte. Quem tem alergia a abelhas pode desenvolver a mesma reação a outros insetos, cujos venenos tenham composição semelhante.


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