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Médicos criticam orientação do Inca
Instituto quer desestimular exames de rotina de toque retal e de PSA para detectar câncer de próstata
Para urologistas, esperar a ocorrência de sintomas é arriscado porque eles só aparecem quando a doença já está em fase avançada
AMARÍLIS LAGE
FERNANDA BASSETTE
DA REPORTAGEM LOCAL
A decisão do Inca (Instituto
Nacional de Câncer) de desaconselhar os exames de toque
retal e de dosagem de PSA para
homens que não tenham sintomas de câncer de próstata foi
criticada por urologistas. Em
nota, a SBU (Sociedade Brasileira de Urologia) disse que "esperar a ocorrência de sintomas
para procurar cuidados médicos pode fazer com que o câncer de próstata esteja em estágio avançado, com impossibilidade de cura".
Segundo Ana Ramalho, gerente da Divisão de Gestão de
Rede Oncológica do Inca, não
há evidências científicas de que
o rastreamento do câncer de
próstata reduza a mortalidade
causada pela doença, por isso o
órgão está desaconselhando os
homens a fazerem o exame.
No rastreamento, a população é convocada para fazer o
exame e buscar detectar a
doença em fase inicial. "Essa
técnica é útil quando provamos
que reduz a mortalidade. É útil
no câncer de colo de útero, mas
não se mostrou eficiente no
câncer de próstata", diz.
De acordo com Ramalho,
pesquisas mostram que há um
excesso de diagnóstico de câncer de próstata, o que aumenta
a chance de identificar tumores
de lenta progressão, que não
afetariam a saúde do paciente.
"Esses pacientes seriam expostos aos riscos do tratamento de
maneira desnecessária. Eles
podem ficar impotentes ou
com incontinência urinária,
sem saber se vão reduzir o risco
de morte", diz. "A idéia é desestimular mesmo."
Para o urologista Miguel
Srougi, professor da USP (Universidade de São Paulo), O Inca
cometeu um "equívoco". Ele
diz que há dois grandes estudos
avaliando o efeito do rastreamento, cujos resultados estão
previstos para 2012. "Se não se
provou que os exames melhoram a sobrevida, tampouco se
provou que têm um efeito
ruim. O que há é um desconhecimento. Se provarem que o
rastreamento aumenta a chance de cura, um sem-número de
homens que não fizeram o exame terão um câncer sem saída."
Segundo ele, embora muitos
países não adotem uma campanha de rastreamento, nenhum
contra-indica o exame.
Qualidade de vida
Inca e SBU divergem quanto
ao impacto do tratamento na
qualidade de vida. Para o Inca
(que usou como fonte um estudo populacional norte-americano), dos homens que tiram a
próstata, até 70% têm disfunção erétil e até 25%, incontinência. Para a SBU, o risco é de
50% e 2%, respectivamente.
Segundo Ubirajara Ferreira,
presidente da SBU - seção São
Paulo, o risco varia conforme a
idade do paciente e a técnica
usada. "Estudos mostram que o
índice de disfunção erétil varia
de 20% a 70% -50% é a média.
O Inca pegou o pior cenário."
Para o urologista Luciano
Nesrallah, do Hospital Alemão
Oswaldo Cruz, o risco de incontinência grave é inferior a 5%.
"Falar em 25% é um exagero.
Não podemos negar ao homem
o direito de querer se prevenir."
Para ele, cabe ao médico avaliar
com o paciente os riscos e benefícios do tratamento.
"O tratamento produz impotência e incontinência. Mas o
que o Inca tem a dizer sobre a
qualidade de vida nos casos de
câncer que deixarão de ser descobertos?", questiona Srougi.
Um problema central da
doença é que ainda não é possível distinguir com precisão os
tumores de progressão lenta
daqueles mais agressivos.
Alexandre Cripa, urologista
do Instituto do Câncer Octavio
Frias de Oliveira, cita um estudo no qual pacientes com bons
prognósticos não foram tratados. Após quatro anos, 75% deles precisaram tratar o câncer.
"Nossa imprecisão não nos dá o
direito de não seguir o tratamento", diz.
Segundo o urologista Fernando Almeida, da Unifesp
(Universidade Federal de São
Paulo), quanto mais jovem for o
paciente, mais agressivo tende
a ser o tumor. "Talvez seja preciso decidir em que idade os homens devem fazer o rastreamento, e não se eles devem ou
não fazer. Os jovens provavelmente vão se beneficiar."
Ramalho, do Inca, diz que o
órgão não está proibindo nenhum homem de fazer os exames. "Quem estiver disposto
pode fazer, mas é bom que esteja ciente dos riscos."
Segundo ela, o Inca pretende
rever a orientação caso os resultados dos estudos previstos
para 2012 mostrem que o rastreamento é eficaz.
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