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Tratamento com célula-tronco alivia as dores da angina
Terapia experimental com material do próprio paciente cria vasos no coração e facilita a irrigação do músculo
Pesquisa brasileira que acompanhou pacientes por cinco anos mostrou sucesso na redução dos sintomas da doença em 80% dos casos
GABRIELA CUPANI
DA REPORTAGEM LOCAL
O tratamento com células-tronco pode ajudar a aliviar os
sintomas de quem sofre de angina do peito, mostra uma pesquisa feita na Universidade Federal de São Paulo em parceria
com a Universidade do Sul da
Flórida, publicada no periódico
"Cell Transplantation".
Se, por um lado, muitos trabalhos atuais mostram que é
muito difícil regenerar o músculo cardíaco, por outro, o novo
estudo reforça a ideia de que é
possível criar vasos sanguíneos.
As células-tronco podem induzir a angiogênese, que é a formação desses vasos. "Apostamos na doença certa", diz o cirurgião cardíaco Nelson Hossne Júnior, um dos líderes da
pesquisa.
A angina ocorre quando há
alguma obstrução nas coronárias e o músculo cardíaco deixa
de receber o aporte correto de
sangue. Isso provoca cansaço
extremo e limitações físicas. Os
portadores da doença chegam a
ter entre 10 e 15 episódios de
dor por dia. "Nos casos de angina refratária, os pacientes já
passaram por todos os tratamentos e não há mais o que oferecer. Muitos já foram submetidos a duas ou três cirurgias e a
vários cateterismos, mas continuam sentindo dores", diz
Hossne. "A função do coração
está normal. O problema deles
é a falta de vasos, não de músculo", resume.
Desde 2005, os pesquisadores da Unifesp vêm avaliando
um grupo de 25 pacientes com
idades entre 53 e 79 anos que
sofriam de angina refratária e
não tinham mais opções cirúrgicas nem respondiam ao tratamento clínico. Eles receberam
a terapia de células-tronco. Os
exames de imagem feitos depois do procedimento mostram que, em 80% dos casos,
houve normalização do fluxo
sanguíneo na área afetada. "Isso é um dado objetivo", diz
Hossner. Os pacientes também
foram avaliados clinicamente.
A melhora dos voluntários
apareceu, em média, três meses
após a cirurgia e continuou
progredindo ao longo de 12 meses. Segundo o artigo, isso sugere que a formação de vasos começa logo e se mantém 18 meses após o procedimento.
Metade dos pacientes deixou
de sentir dor. Os demais têm
poucos episódios de sofrimento e, ainda assim, apenas quando realizam esforços físicos intensos. Cerca de 90% deles retomaram as atividades normais
quatro meses após a cirurgia.
Os cientistas afirmam que o alívio dos sintomas foi progressivo, sugerindo que não se trata
de um efeito transitório.
Ainda não se conhece o mecanismo exato que leva à formação de novos vasos no coração. Uma das hipóteses é que a
presença das células-tronco
amplifique a resposta de outras
células que estão lá encarregadas dessa função.
A pesquisa também constatou que, quanto maior a presença de monócitos -um tipo
de célula de defesa- associados
à célula-tronco, melhor a resposta clínica do paciente.
Células do paciente
Na operação, os médicos retiram células-tronco adultas da
própria pessoa, presentes na
medula óssea, no osso da bacia.
Entre outras vantagens, isso diminui o risco de rejeição. As células são isoladas e, em seguida,
injetadas diretamente nas
áreas do músculo cardíaco que
se encontravam em sofrimento, por um pequeno corte de
dez centímetros. A identificação dessas regiões tinha sido
feita por exames de imagem,
como a cintilografia.
No artigo, os autores reconhecem que uma das limitações do estudo é a falta de um
grupo-controle para avaliar o
efeito placebo -ainda que o benefício tenha se mantido ao
longo do tempo e tenha sido
observado em exames. "Há evidências de que as células-tronco podem formar vasos mas,
sem um grupo-controle, não é
possível afirmar que o benefício esteja diretamente relacionado ao uso delas", pondera
Antônio Carlos Campos de
Carvalho, chefe do departamento de ensino e pesquisa do
Instituto Nacional de Cardiologia, no Rio de Janeiro.
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