São Paulo, quinta-feira, 20 de agosto de 2009

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Exame detecta endometriose sem cirurgia

Método criado por pesquisadores australianos e belgas foi testado em 99 mulheres; outros estudos são necessários

Novo procedimento colhe fragmentos do endométrio no exame ginecológico, sem anestesia, e depois analisa a presença de fibras nervosas


FERNANDA BASSETTE
JULLIANE SILVEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Pesquisadores australianos e belgas desenvolveram um novo procedimento para diagnosticar endometriose precocemente e de maneira menos invasiva, sem a necessidade de laparoscopia. Para isso, fizeram um estudo randomizado e duplo-cego com 99 mulheres. Os resultados foram publicados anteontem na revista científica "Human Reproduction".
Hoje a cirurgia é considerada a única maneira efetiva de diagnosticar precocemente a doença. A outra opção -o ultrassom- identifica apenas os casos mais avançados. Estima-se que de 30% a 40% das operações não confirmem o diagnóstico, o que mostra que as mulheres estão se submetendo ao procedimento desnecessariamente. Por isso, médicos do mundo todo tentam encontrar uma forma menos invasiva de fazer o diagnóstico.
A nova técnica foi apresentada no congresso internacional de endometriose, na Austrália. Consiste em colher pequenos fragmentos do endométrio (tecido que reveste o útero) durante um exame ginecológico convencional, no consultório, sem a necessidade de anestesia (apenas tomando um analgésico oral). Em seguida, analisa-se o material à procura de fibras nervosas no tecido.
Segundo o professor Moamar Al-Jefout, um dos autores do estudo, é possível fazer o diagnóstico com precisão em praticamente 100% dos casos. Segundo ele, as 64 mulheres que tiveram a doença confirmada pela cirurgia também tiveram o teste positivo para a presença das fibras nervosas.
Além disso, 29 das 35 mulheres que não confirmaram a doença pela cirurgia também não tinham fibras nervosas no tecido. "A presença das fibras nervosas pode estar envolvida no aparecimento da dor. A gente acredita que elas possam estar envolvidas no fenômeno", afirmou Al-Jefout à Folha.
O ginecologista Carlos Alberto Petta, professor da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), afirma que o estudo abre novas perspectivas para que seja possível diagnosticar precocemente a doença.
"É muito frequente fazermos cirurgias e descobrirmos que a mulher não tinha endometriose. A vantagem dessa nova técnica é que, se comprovada sua eficácia, ela acaba com as cirurgias desnecessárias. A gente conseguiria triar melhor as pacientes", afirma Petta.
Para o ginecologista Maurício Abrão, responsável pelo Setor de Endometriose da Clínica Ginecológica do Hospital das Clínicas de São Paulo, o procedimento é uma tentativa interessante para o diagnóstico de uma doença que requer um exame invasivo. Ele considera, no entanto, a amostra pequena para que seja possível tornar o método uma rotina. "Quando se fala de endometriose no Brasil, fala-se de mais de 6 milhões de mulheres. Será que cem casos refletem essa quantidade?".
Para a ginecologista Ivete de Ávila, presidente da Comissão de Endometriose da Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia), o trabalho é inovador, mas tem outro fator que precisa ser levado em conta.
"É um procedimento simples, mas com custo alto. Não adianta termos um método de coleta simples, mas com uma análise laboratorial que exige um microscópio ultramoderno e reagentes caríssimos", diz.

Ultrassom
A ultrassonografia especializada tem se mostrado uma alternativa menos invasiva para apontar focos de crescimento de tecido fora do endométrio.
De acordo com Abrão, o médico ultrassonografista treinado para identificar a endometriose é capaz de detectar o problema no ovário e a forma mais profunda da doença (que infiltra bexiga, ligamentos, intestino, entre outros órgãos).
O ultrassom também auxilia o médico a prever o que encontrará na cirurgia. "A vantagem é ir para o procedimento [laparoscopia] com uma informação prévia", defende Abrão.
Segundo Petta, no entanto, a desvantagem do ultrassom é que, normalmente, só se consegue visualizar casos avançados. E, quando a endometriose é diagnosticada tardiamente, é mais difícil de tratar, ocorre maior dificuldade para engravidar e há risco de ser necessária a retirada do útero.

Doença frequente
A endometriose é uma doença ginecológica crônica, em que parte do endométrio se estabelece fora do útero, provocando cólicas intensas, dor durante a relação sexual e infertilidade. A doença atinge entre 10% e 15% das mulheres em idade fértil.
O tratamento da endometriose é cirúrgico (para retirada dos nódulos e cistos). Não há cura, apenas controle clínico, com medicamentos para diminuir a dor. A doença pode voltar a se manifestar.


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