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Estudo liga risco de câncer hepático a hipotireoidismo
Pesquisadores avaliaram 420 pacientes com câncer e 1.104 pessoas saudáveis
Segundo o trabalho, mulher com distúrbio tem risco 2,9 vezes maior de desenvolver tumor no fígado; o mesmo não se nota entre homens
FERNANDA BASSETTE
DA REPORTAGEM LOCAL
Mulheres com hipotireoidismo (distúrbio que diminui a
produção de hormônios) podem ter risco três vezes maior
de desenvolver câncer de fígado do que aquelas que não têm
a doença, sugere estudo realizado por pesquisadores do MD
Anderson Cancer Center
(EUA), publicado neste mês na
revista científica "Hepatology".
De acordo com os pesquisadores, se a mulher também tiver diabetes, o risco é aumentado em 9,4 vezes. E se ela somar
o hipotireoidismo a hepatite B
ou C crônica, o risco de ter a
doença aumenta 31,2 vezes. A
mesma condição não foi observada entre os homens -por razões ainda não explicadas.
O estudo foi realizado com
base nas respostas a um questionário aplicado para 420 pacientes em tratamento contra o
câncer no fígado e para um grupo controle, formado por 1.104
pessoas teoricamente sadias.
Entre os pacientes com câncer entrevistados, 12% afirmaram ter hipotireoidismo e, no
grupo controle, 8% relataram
ter a doença. Para os pesquisadores, a diferença é suficiente
para estabelecer uma relação
até então não quantificada entre as duas doenças.
Como o hipotireoidismo provoca uma deficiência na quantidade de hormônios circulando no organismo e altera toda a
função metabólica -aumentando os níveis de colesterol,
por exemplo-, os pesquisadores acreditam que isso pode aumentar o risco de a pessoa desenvolver esteato-hepatite
(acúmulo de gordura no fígado)
e, consequentemente, aumentar o risco de cirrose ou do desenvolvimento de um tumor.
A endocrinologista Ana Luiza Maia, chefe do Setor de Tireoide do Hospital das Clínicas
de Porto Alegre e professora da
UFRGS (Universidade Federal
do Rio Grande do Sul), diz que o
estudo tem um impacto muito
forte por sugerir que a disfunção na tireoide, sozinha, apresenta um risco aumentado de a
mulher desenvolver um tumor
hepático -quinto câncer mais
incidente do mundo.
"Os resultados me surpreenderam. Existem alguns estudos
que relacionam o hipotireoidismo com problemas hepáticos
[no caso, a esteato-hepatite],
mas nenhum trouxe uma associação direta entre a disfunção
tireoidiana e o risco de câncer",
afirma a professora.
Maia ressalta, entretanto,
que o estudo não deixa claro se
as mulheres que tratam adequadamente o hipotireoidismo
também têm o risco aumentado. "Teoricamente, quem trata
a doença não tem mais a alteração hormonal e não vai ter problemas hepáticos. Assim, sairia
do grupo de risco", diz.
A endocrinologista Laura
Sterian Ward, vice-presidente
do Departamento Nacional de
Tireoide da Sbem (Sociedade
Brasileira de Endocrinologia e
Metabologia) diz que os resultados apresentados "parecem
reais estatisticamente", mas
critica a metodologia.
"É um estudo que tem como
referência as respostas pessoais dos pacientes. Os pesquisadores não dosaram os hormônios TSH e T4 [relacionados
ao hipotireoidismo] no grupo
controle para confirmar a existência da doença. Informação
pessoal pode ter erro", avalia.
Predisposição
Para Felipe José Fernández
Coimbra, cirurgião oncológico
e diretor do Departamento de
Cirurgia Abdominal do Hospital A.C.Camargo, os resultados
podem se tornar mais uma ferramenta de acompanhamento
dos fatores de risco em mulheres com predisposição a câncer
hepático (que somem alcoolismo, obesidade e diabetes).
"Não é todo mundo que tem
hipotireoidismo que vai ter
câncer. Esse é um dos primeiros estudos a mostrar uma relação direta entre a doença da tireoide e o aumento de risco para o tumor de fígado. Acho que
os resultados mostram uma relação aumentada de risco e não
de causa", afirma Coimbra.
Para o cirurgião, os hepatologistas devem ficar mais atentos
a alterações no funcionamento
da tireoide. "Os dados são mais
uma arma para prevenir o hepatocarcinoma, combinados ao
tratamento da hepatite, do diabetes e do alcoolismo".
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