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Fluoxetina é mal usada em fórmulas para emagrecer
Levantamento revela associação do princípio ativo com vários componentes
Combinação com outras drogas pode potencializar efeitos, comprometer reflexos e desencadear problemas psiquiátricos
GABRIELA CUPANI
DA REPORTAGEM LOCAL
A fluoxetina, princípio ativo
de antidepressivos como o Prozac, vem sendo utilizada de forma inadequada em fórmulas
para emagrecer.
O dado é de um levantamento feito pelo Cebrid (Centro
Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas) que
avaliou 39.782 receitas especiais em Santo André, na Grande São Paulo. Dessas, 10.919
continham esse princípio ativo.
Os resultados estão publicados
na edição mais recente do "Jornal Brasileiro de Psiquiatria".
Em praticamente todas as
prescrições manipuladas em
farmácias (identificadas como
magistrais ou de manipulação),
a fluoxetina estava associada a
outras substâncias normalmente indicadas para induzir a
anorexia e promover a perda de
peso. As mais frequentes foram
benzodiazepínicos (presentes
em 62,5% das receitas) e anfetaminas (em 45,8% delas).
As chamadas receitas especiais se referem às 175 substâncias de venda controlada pela
Anvisa (Agência Nacional de
Vigilância Sanitária), que ficam
retidas nos estabelecimentos.
Nas receitas avaliadas, os autores encontraram associações
de fluoxetina com, em média,
de quatro a sete substâncias.
Mas em um dos casos havia 22
componentes. Quase 80% das
receitas eram destinadas a mulheres, segundo o estudo.
"Esse tipo de prescrição múltipla é compatível com as fórmulas usadas para emagrecer",
explica o psicólogo Vilmar Ezequiel dos Santos, um dos responsáveis pela pesquisa. "Resultados de outros estudos feitos em outras cidades brasileiras levam a crer que o cenário é
similar no resto do país."
Inibição de apetite
Dados da ONU revelam que o
Brasil está entre os maiores
consumidores mundiais de
drogas para inibir o apetite. Em
2007, o país estava no topo do
ranking, ao lado da Argentina e
dos Estados Unidos.
Segundo o endocrinologista
Bruno Geloneze, vice-presidente do departamento de obesidade da Sociedade Brasileira
de Endocrinologia e Metabologia, a fluoxetina nunca deve ser
combinada a outras drogas em
fórmulas -independentemente da finalidade terapêutica.
Essa associação é mais arriscada quando inclui fármacos
que, como a fluoxetina, agem
no sistema nervoso central. É o
caso dos derivados de anfetaminas e benzodiazepínicos.
"Essa interação pode levar a
um aumento dos efeitos", diz o
psiquiatra Adriano Segal, diretor de psiquiatria e transtornos
alimentares da Abeso (Associação Brasileira para o Estudo da
Obesidade e Síndrome Metabólica). Em combinação com
benzodiazepínicos, por exemplo, pode haver aumento da sedação, o que compromete os reflexos. No caso da associação
com anfetaminas, pode desencadear crises psiquiátricas.
Se a associação da fluoxetina
é feita com agentes de ação
não-central (como diuréticos,
laxantes, fibras ou fitoterápicos), também comum nas receitas avaliadas, o risco é menor. "Mas ainda assim não há
justificativa" , diz Geloneze.
Sabe-se que a fluoxetina pode ser usada em algumas situações para pacientes que precisam perder peso. Estudos recentes apontam benefícios em
indivíduos com compulsão alimentar e nos que ganharam peso usando antipsicóticos.
No entanto, ela é considerada um medicamento de segunda escolha quando a finalidade
é emagrecimento. Seu uso tem
que ser bem indicado e o paciente não pode ter contraindicações psiquiátricas.
"Todas as medicações para
emagrecer podem ser usadas
de forma coerente e responsável ou de forma inadequada",
afirma Márcio Mancini, presidente da Abeso. "O uso desses
coquetéis [que combinam a
fluoxetina] é má prática."
Outro dado que chama a
atenção é o grande número de
receitas encontradas no levantamento contendo a fluoxetina.
Pouco mais de um quarto das
prescrições continham a substância, independentemente de
ela estar associada a outras.
De acordo com o endocrinologista Bruno Geloneze, esse
resultado pode ser considerado
um indício do abuso desse medicamento. "Grande parte das
receitas para emagrecer são feitas para quem não precisa."
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