São Paulo, segunda-feira, 23 de novembro de 2009

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ANÁLISE

Médicos não criaram todas essas restrições

HÉLIO SCHWARTSMAN
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

É verdade que, em relação ao projeto original, de 2002, a atual proposta de regulamentação do ato médico é quase republicana: psicólogos, dentistas, fonoaudiólogos etc. não estão mais impedidos de fazer os diagnósticos necessários à sua profissão. Não obstante esse significativo avanço, o PL nº 7.703/06 permanece escandalosamente corporativista.
Apenas a ânsia por tentar estabelecer a maior reserva de mercado possível explica a existência de dispositivos que tornam a colocação de piercings e a aplicação de tatuagens atos privativos de médicos.
Foram com tanta sede ao pote que produziram uma piada involuntária, ao tornar o sexo uma zona restrita: segundo o art. 4º, pár. 4º, III, "a invasão dos orifícios naturais do corpo" é prática exclusiva da classe.
Na mesma linha de irrazoabilidade vai o art. 5, que proíbe não médicos de chefiar serviços médicos ou de lecionar disciplinas médicas. Dependendo de como a norma for interpretada, inviabiliza-se a função de administrador hospitalar.
Diga-se em favor dos médicos que não foram eles que criaram todas essas restrições. Eles só reproduziram dispositivos constantes das regulamentações profissionais das categorias que agora se queixam do corporativismo médico.
O problema, no fundo, são as raízes fascistas que permeiam a sociedade brasileira. As pessoas não se veem como cidadãs de uma República, mas como representantes de um segmento social que seria detentor de direitos naturais. O que se busca é inscrever em lei as reivindicações decorrentes desses "direitos" e esperar que o Estado as implemente. Viramos o país das corporações.

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