São Paulo, quinta-feira, 23 de dezembro de 2010 |
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"Eu me sentia a dona do mundo quando saía comprando" DE SÃO PAULO "Meu nome é Marlene*. Sou devedora compulsiva." Começa assim a reunião semanal, que ocorre nos fundos de uma igreja. Nessa quinta-feira, são cinco endividados compartilhando preocupações, e o décimo terceiro salário é tema recorrente nos depoimentos. Compras compulsivas, quase sempre, puseram essa gente no vermelho. "Eu me sentia a dona do mundo quando saía comprando. Se via que o dinheiro ia acabar, gastava ainda mais", depõe Luana, secretária de uns 30 anos, em sua sétima reunião. Luana diz também que passou 15 dias com R$ 80 no bolso e sobreviveu. E que talvez use o décimo terceiro para negociar pendências. "Fico querendo que a dívida desapareça sozinha." Ninguém interrompe ou aconselha. Só Marlene controla o tempo de cada um. O ritual é o de grupos de ajuda mútua. Nas regras de conduta adaptadas do Alcoólicos Anônimos, o termo "álcool" foi trocado por "endividamento compulsivo". Após um relato, a advogada Marlene, no grupo há dez anos, lê: "Para ser membro, o único requisito é o desejo de saldar as dívidas sem colocar os bens em garantia". "Sou autônomo, nem décimo terceiro ganho para ajudar a pagar juros", lamenta o consultor de empresas Jair. Enquanto ele fala, a estudante Carolina mexe e remexe em um bolinho de notas fiscais. Quando chega sua vez, traça planos de viajar, ou usar todo o décimo terceiro para quitar o dentista. Fábio, desempregado, diz que fez 20 anos de terapia. Mas o que ajudou, segundo ele, foram os três meses de convívio com outros compulsivos. "Achei a chave da minha solvência emocional." Duas horas depois, todos se dão as mãos e rezam. Marlene encerra: "Desejo a todos solvência, prosperidade e bom Natal". (GG) *Os nomes foram trocados para preservar a identidade dos Devedores Anônimos Texto Anterior: A doença da dívida Índice | Comunicar Erros |
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