|
Próximo Texto | Índice
Negros fumantes têm cinco vezes mais risco de câncer
Pesquisa da Unicamp analisou 464 pessoas, 200 delas com câncer de pulmão
Hipótese é que mutação genética seja capaz de potencializar a ação dos componentes com potencial carcinogênico do cigarro
FERNANDA BASSETTE
DA REPORTAGEM LOCAL
A população negra brasileira
que fuma tem até 5,21 vezes
mais riscos de desenvolver câncer de pulmão do que os brancos fumantes. A constatação é
de uma pesquisa realizada pela
Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), que foi
apresentada no Congresso Europeu de Pneumologia.
O câncer de pulmão é considerado o de maior mortalidade
no mundo. Cerca de 90% dos
casos estão relacionados ao
consumo excessivo ou à exposição passiva ao tabaco. Para realizar o estudo, os pesquisadores
da Unicamp avaliaram 464 pessoas, sendo 200 portadoras de
câncer de pulmão e 264 saudáveis e não fumantes.
Segundo o pneumologista
Lair Zambon, autor do estudo,
a maioria dos negros avaliados
apresentou uma mutação no
gene CYP1A1*2A que é capaz
de potencializar a ação dos
componentes carcinogênicos
presentes no cigarro, especialmente o benzopireno -substância altamente cancerígena.
Cada cigarro possui mais de
4.000 substâncias e cerca de
cem delas têm potencial para
provocar câncer.
"Observamos que essa alteração genética é a mais comum
encontrada nos negros e descobrimos que essa mutação está
fortemente associada ao aparecimento do câncer de pulmão
nessas pessoas", diz Zambon.
Segundo o pesquisador, esse
gene é responsável por facilitar
o mecanismo de eliminação do
benzopireno pelo organismo.
Com o gene alterado e a dificuldade de eliminar a substância,
aumenta o risco de desenvolver
o câncer de pulmão.
Zambon reforça, entretanto,
que os resultados refletem a situação dos negros brasileiros e
não podem ser estendidos para
toda a população negra -pois
há a possibilidade de serem geneticamente diferentes.
O pneumologista Mauro
Zamboni, do Serviço de Cirurgia Torácica do Inca (Instituto
Nacional de Câncer), diz que
vários trabalhos em todo o
mundo vêm sugerindo essa
possibilidade de maior incidência de casos na população negra, mas os resultados são conflitantes e não definitivos.
"Apesar de o estudo ter um
bom número de pessoas envolvidas, acho que amostra ainda é
reduzida para ser extrapolada
para a população brasileira na
sua totalidade. O assunto é interessante, mas merece continuar sendo estudado", diz.
Prática clínica
Para o pesquisador, os resultados têm impacto imediato na
prevenção da doença nessa população, por meio de campanhas educativas que estimulem
as pessoas a parar de fumar.
Ele diz ainda que, apesar dos
resultados apontarem para
uma questão genética, os pneumologistas não devem passar a
fazer testes genéticos nos negros que fumam porque isso seria economicamente inviável.
"É muito caro e praticamente impossível fazermos exames
genéticos em todo mundo. Temos argumentos suficientes
para explicar aos fumantes negros que eles têm risco aumentado de desenvolver câncer de
pulmão e que, por isso, devem
parar de fumar", diz.
O oncologista Jefferson Luiz
Gross, diretor do Setor de Cirurgia Torácica do Hospital
A.C.Camargo, acredita que o
estudo poderá ter um impacto
no desenvolvimento de tratamentos para esses pacientes.
"Se você sabe que determinado
gene está relacionado ao aparecimento do câncer, você pode
estudar formas de bloquear a
ação desse gene."
Gross também afirmou que
essa população não deve passar
por exames genéticos, pois os
negros que não fumam e apresentarem a mutação não têm o
risco de câncer aumentado. "O
grande vilão do câncer do pulmão é o cigarro. Em vez de fazer
teste genético, é melhor convencermos as pessoas a parar
de fumar", afirma.
Próximo Texto: Enxaqueca: Fumar mais de cinco cigarros provoca crises Índice
|