|
Próximo Texto | Índice
Novo código de ética proíbe médico de vender remédio
Prática é comum em consultórios dermatológicos e de reprodução assistida
Profissionais não serão
proibidos de receber brindes
da indústria farmacêutica,
mas terão que revelar esse
conflito de interesses
CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL
O novo Código de Ética Médica, que será aprovado hoje
pelo CFM (Conselho Federal
de Medicina), veta a participação de médicos em consórcios
para realização de procedimentos, como cirurgias plásticas.
Eles também estão proibidos
de obter vantagens financeiras
pela comercialização de medicamentos, órteses e próteses.
Hoje, é comum a venda de
medicamentos e de outros produtos em várias áreas da medicina, como em clínicas de reprodução assistida ou em consultórios dermatológicos.
Muitos médicos, especialmente das áreas de cirurgia cardiovascular, cirurgia plástica,
neurocirurgia, oftalmologia e
ortopedia, também recebem
comissões da indústria por indicarem seus produtos.
Segundo um ortopedista de
São Paulo, que pediu para não
ser identificado, o custo do material usado em uma cirurgia de
coluna, por exemplo, varia entre R$ 20 mil e R$ 100 mil. A comissão de alguns médicos para
a indicação de determinada
prótese ou implante, por exemplo, seria de 10% a 20% do valor
do produto comercializado.
O novo código de ética não
vai proibir que os médicos recebam brindes ou viajem bancados pela indústria farmacêutica, mas determinará que eles
revelem esse conflito de interesse antes de apresentações
em congressos, por exemplo, e
em publicações científicas.
"Não dá para colocar um artigo dizendo que é proibido um
professor ser garoto propaganda da indústria farmacêutica.
Se a pessoa declara que é paga
pela indústria farmacêutica,
quem faz o julgamento é quem
a ouve", diz Roberto D'Ávila,
coordenador da comissão responsável pela revisão do Código de Ética Médica.
Para ele, o caminho é tornar
transparentes essas relações
conflituosas. "De qualquer forma, foi um avanço nessa discussão que, até então era muito
escamoteada, muito hipócrita.
E o paciente é o único prejudicado nessa relação conflituosa", reforça D'Ávila.
O conselheiro Ylmar Corrêa
Neto, também membro da comissão, lembra que o conflito
de interesse é um assunto antigo na história da medicina - a
primeira citação, de Aristóteles, data de 2.500 anos atrás- e
não necessariamente configura
uma infração ética. Um subsídio para um congresso médico,
por exemplo, em que o profissional vai se atualizar e poderá
reverter isso em benefício do
paciente, não seria antiético.
"O interesse deve ser sempre
a saúde do paciente. Quando há
um desvio para o interesse secundário, passa a ser corrupção
médica", explicou Corrêa Neto,
durante conferência anteontem em São Paulo.
No evento, o médico Luiz Roberto Londres, diretor-presidente da Clínica São Vicente,
no Rio, foi enfático em dizer
que a corrupção médica está
"galopante" e que os médicos
são os maiores responsáveis
por essa situação. "Perdemos a
noção do que é ético. Os médicos têm que decidir de que lado
estão: do ser humano ou dos
negócios."
O conflito de interesse foi um
dos temas centrais nas discussões sobre a mudança do novo
código, que começaram na última terça-feira e terminam hoje
em São Paulo. Foram dois anos
de debates com diversas entidades e especialistas e a análise
de 2.575 sugestões encaminhadas por médicos e outras entidades.
Muitas das novas decisões
sobre conflito de interesse já
constam em resoluções do
CFM, mas não estavam no código de ética, cuja última versão
foi editada em 1988. "O código é
a nossa carta magna. Todos os
artigos que constam nele têm
mais força de fiscalização e de
sanção", explica o médico Clóvis Constantino, membro da diretoria do CFM.
Outros temas
O novo código de ética também deve tratar da autonomia
do paciente e do médico. Os riscos e os benefícios de um determinado tratamento, por exemplo, devem ser esclarecidos de
forma clara ao paciente e a decisão de fazê-lo ou não deve ser
tomada em conjunto.
O termo de consentimento
informado também foi bastante debatido. "Ele tem quer um
instrumento que proteja o paciente, não o médico", afirma
Clóvis Constantino.
Outro conceito que entrará
pela primeira vez no código são
os cuidados paliativos. "Alguns
artigos vão mostrar aos médicos que eles têm o dever de oferecer os cuidados paliativos a
pacientes críticos", diz ele.
Próximo Texto: Frases Índice
|