São Paulo, sábado, 30 de outubro de 2010

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Especialista da ONU critica o atual padrão para rótulos de alimentos

Embalagens são complexas demais, diz o professor Ricardo Uauy

IARA BIDERMAN
DE SÃO PAULO

O modelo atual de embalagens alimentares não favorece escolhas saudáveis, diz o professor Ricardo Uauy, da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres. Para ele, que leciona nutrição em saúde pública e é consultor da FAO (a agência da ONU para agricultura e alimentação), os dados nutricionais deveriam ser claros e resumidos a: sal, açúcar, gorduras e calorias. O desafio, afirma, é convencer a indústria de que a redução de alguns ingredientes é necessária e pode até beneficiar as vendas. Segundo Uauy, as empresas deveriam se comprometer com metas, mesmo que a longo prazo. Em troca, receberiam selos ou o "sinal verde" de instituições de saúde. O professor, que é chileno e participa de fórum mundial sobre alimentos realizado pela ONU e a OMS, esteve este mês em São Paulo, quando deu esta entrevista à Folha.

 

Folha - Qual o papel das informações nutricionais nas embalagens de alimentos?
Ricardo Uauy - Antigamente, quando a preocupação era a falta de certos nutrientes, os alimentos eram enriquecidos com vitaminas e essa informação é destacada na embalagem. Hoje, as principais causas de morte no mundo não são as deficiências nutricionais, mas o excesso de alguns alimentos aliado ao sedentarismo. Seria bom se as pessoas diminuíssem o consumo de açúcar, mas em quanto? Se você diz que tal produto tem 60 g de vitamina C você sabe que pode prevenir escorbuto, mas se tem 30 g de açúcar por 100 g, o consumidor tem que ser bom de cálculo para saber se vale a pena comer.

Como ajudar a compreensão?
Primeiro, se fixando nos quatro ingredientes mais associados às doenças que mais matam hoje: sal, açúcar, gorduras trans e saturadas. E no total de calorias. Depois, definindo as porções e dizendo claramente se a quantidade de alguns desses ingredientes ou de calorias é excessiva por porção.

Há uma forma clara de dizer?
Alguns países estão procurando o melhor modelo. No Reino Unido estão usando o sistema de luzes de trânsito para mostrar se a quantidade de gorduras, sal e açúcar é alta (vermelho), média (amarelo) ou baixa (verde).

Está ajudando?
Precisamos ver se vai mudar as escolhas do consumidor. O fabricante não quer ter um sinal vermelho, mas se ele reduzir pela metade o sal de um produto de uma hora para outra o consumidor não vai gostar, seu paladar está acostumado ao sal. De um lado, temos de informar o consumidor do jeito mais simples possível. De outro, temos que estimular as empresas a reduzirem aos poucos os nutrientes que podem fazer mal à saúde, estabelecendo uma meta.

Enquanto isso, não deveria ter avisos na embalagem do tipo "contém muito sal"?
Isso é um dos caminhos, mas para o fabricante é o mesmo que dizer: não comprem meu produto, é perigoso à saúde. A empresa pode se comprometer a uma diminuição de ingredientes realista para o seu produto.

As tabelas usadas nos rótulos ajudam de alguma maneira?
Essas informações são obrigatórias, dão detalhes da composição, mas não fica claro o que pode ser excessivo [em termos de nutrientes]. São de uma complexidade desnecessária. Só um consumidor supersofisticado pode entender esses rótulos.

Qual seria uma boa forma de informar o consumidor?
Poderia ser algo: alto teor de açúcar que, em excesso, faz mal à saúde. Mas o modelo de negócios não está baseado no interesse da saúde pública. Para mudar, é preciso políticas públicas, pressão do consumidor e convencer os departamentos de marketing que assumir um compromisso com a saúde do consumidor, reduzindo alguns ingredientes, também pode ser uma estratégia de vendas.


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