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Especialista da ONU critica o atual padrão para rótulos de alimentos
Embalagens são complexas demais, diz o professor Ricardo Uauy
IARA BIDERMAN
DE SÃO PAULO
O modelo atual de embalagens alimentares não favorece escolhas saudáveis, diz o
professor Ricardo Uauy, da
Escola de Higiene e Medicina
Tropical de Londres.
Para ele, que leciona nutrição em saúde pública e é consultor da FAO (a agência da
ONU para agricultura e alimentação), os dados nutricionais deveriam ser claros e
resumidos a: sal, açúcar, gorduras e calorias.
O desafio, afirma, é convencer a indústria de que a
redução de alguns ingredientes é necessária e pode até
beneficiar as vendas.
Segundo Uauy, as empresas deveriam se comprometer com metas, mesmo que a
longo prazo. Em troca, receberiam selos ou o "sinal verde" de instituições de saúde.
O professor, que é chileno
e participa de fórum mundial
sobre alimentos realizado
pela ONU e a OMS, esteve este mês em São Paulo, quando
deu esta entrevista à Folha.
Folha - Qual o papel das informações nutricionais nas embalagens de alimentos?
Ricardo Uauy - Antigamente, quando a preocupação
era a falta de certos nutrientes, os alimentos eram enriquecidos com vitaminas e essa informação é destacada
na embalagem. Hoje, as principais causas de morte no
mundo não são as deficiências nutricionais, mas o excesso de alguns alimentos
aliado ao sedentarismo. Seria bom se as pessoas diminuíssem o consumo de açúcar, mas em quanto? Se você
diz que tal produto tem 60 g
de vitamina C você sabe que
pode prevenir escorbuto,
mas se tem 30 g de açúcar por
100 g, o consumidor tem que
ser bom de cálculo para saber se vale a pena comer.
Como ajudar a compreensão?
Primeiro, se fixando nos
quatro ingredientes mais associados às doenças que
mais matam hoje: sal, açúcar, gorduras trans e saturadas. E no total de calorias.
Depois, definindo as porções
e dizendo claramente se a
quantidade de alguns desses
ingredientes ou de calorias é
excessiva por porção.
Há uma forma clara de dizer?
Alguns países estão procurando o melhor modelo. No
Reino Unido estão usando o
sistema de luzes de trânsito
para mostrar se a quantidade
de gorduras, sal e açúcar é alta (vermelho), média (amarelo) ou baixa (verde).
Está ajudando?
Precisamos ver se vai mudar as escolhas do consumidor. O fabricante não quer ter
um sinal vermelho, mas se
ele reduzir pela metade o sal
de um produto de uma hora
para outra o consumidor não
vai gostar, seu paladar está
acostumado ao sal. De um lado, temos de informar o consumidor do jeito mais simples possível. De outro, temos que estimular as empresas a reduzirem aos poucos
os nutrientes que podem fazer mal à saúde, estabelecendo uma meta.
Enquanto isso, não deveria
ter avisos na embalagem do
tipo "contém muito sal"?
Isso é um dos caminhos,
mas para o fabricante é o
mesmo que dizer: não comprem meu produto, é perigoso à saúde. A empresa pode
se comprometer a uma diminuição de ingredientes realista para o seu produto.
As tabelas usadas nos rótulos
ajudam de alguma maneira?
Essas informações são
obrigatórias, dão detalhes da
composição, mas não fica
claro o que pode ser excessivo [em termos de nutrientes].
São de uma complexidade
desnecessária. Só um consumidor supersofisticado pode
entender esses rótulos.
Qual seria uma boa forma de
informar o consumidor?
Poderia ser algo: alto teor
de açúcar que, em excesso,
faz mal à saúde. Mas o modelo de negócios não está baseado no interesse da saúde
pública. Para mudar, é preciso políticas públicas, pressão
do consumidor e convencer
os departamentos de marketing que assumir um compromisso com a saúde do consumidor, reduzindo alguns ingredientes, também pode ser
uma estratégia de vendas.
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