São Paulo, quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

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Sem diagnóstico

A ansiedade de quem sofre com sintomas, faz exames, mas não recebe uma resposta definitiva dos médicos pode ser pior do que a de quem descobre ter uma doença grave

Guilherme Pupo/Folhapress
Bruno Soares, 12, de Curitiba, tem uma caixa de exames em casa, mas nada de diagnóstico

MARIANA VERSOLATO
DE SÃO PAULO

Eles vivem tensos, com medo de uma piora repentina. Saem frustrados do médico ao ouvir: "Seus exames estão perfeitos". E esperam por um resposta, para saber o que têm e como tratar.
Não saber o diagnóstico de uma doença pode gerar mais estresse do que receber a notícia de que se tem um problema de saúde grave.
A constatação, de um estudo da Sociedade Norte-Americana de Radiologia, é confirmada por quem vive a angústia de não ter respostas para suas dores.
Conhecer a causa dos sintomas dá conforto ao paciente, porque tira o foco da ameaça da doença, diz o psiquiatra Renério Fráguas Júnior, do HC de São Paulo. "O problema passa a ter nome e prescrição médica."
Ceane Soares, de Curitiba, espera por um "nome" há 12 anos. Seu filho, Bruno, nasceu em 1998 e teve hipoglicemia no segundo dia de vida. Aos seis meses, não ficava "durinho" e era apático, não sorria nem chorava.
Um neuropediatra constatou que ele tinha traços autistas. Meses depois, começou a ter convulsões que nenhum remédio controlava.
Bruno já recebeu os diagnósticos "mais cabeludos", diz a mãe, todos descartados.
Tanta investigação rendeu uma caixa de exames no guarda-roupa: tomografias, ressonâncias, avaliações genéticas, endoscopias.
"A gente o observa 24 horas por dia. Nunca sabemos se a medicação é a certa, se vai melhorar. Estamos andando sem saber para onde."
A sensação de estar perdido é compartilhada pelo professor J.S., 25, de São Paulo. Neste ano, ele começou a ter urticária. Foi a dermatologistas, alergistas, fez exames e foi internado com dores e inchaço no rosto e no corpo.
Em 45 dias, gastou quase R$ 1.000 em remédios, trocados a cada nova consulta.
Os médicos cogitaram imunidade baixa, estresse, sífilis e Aids. Exames para os dois últimos deram negativo.
J.S. também tem convulsões. Foi a neurologistas e cada um fez um diagnóstico. "Não saber o que acontece no próprio corpo assusta."

COMUNICAÇÃO
Infelizmente, é comum que urticárias fiquem sem solução, diz Ana Paula Castro, presidente da Associação Brasileira de Alergia e Imunopatologia de SP.
Exames de sangue detectam substâncias que causam alergia. Mas não há testes para várias delas, como remédios, corantes e conservantes. O diagnóstico é limitado.
Em casos sem solução, médicos e pacientes concordam: a ansiedade é pior quando a comunicação entre as duas partes é falha.
Profissionais que prescrevem drogas e exames sem explicar por que geram desconfiança nos pacientes.
A aposentada Maria Amália Moraes, 57, que passou quase a vida toda acordando com dores nos olhos e nas têmporas, reclama que sua relação com os médicos foi sempre superficial.
Quatro vezes ao ano, tomava antibióticos para uma suposta sinusite, mas achava que o problema tinha origem dentária. "Já gastei o valor de um carro na minha boca."
Foi uma dentista que acertou o que ela tinha: distúrbio temporomandibular (DTM), que a fazia apertar os dentes durante o sono. A solução é uma placa usada à noite.
A aposentada criou um blog para ajudar quem tem o problema (doressemdiagnostico.blogspot.com).
Maria Amália diz que torcia para que os exames achassem o problema. Quando isso não acontecia, saía chorando do consultório.
"Ficava desiludida. Ao mesmo tempo, agradecia a Deus por não ter nada grave. Achavam que eu inventava doenças, ninguém acreditava nas dores."


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