São Paulo, sexta-feira, 31 de outubro de 2008

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Brasil tem 25 bebês gerados com óvulos vitrificados

Técnica aprimorada é adotada em 11 outros países e já gerou 600 crianças

Especialistas brasileiros questionam a utilidade do procedimento e dizem que ainda é preciso analisar resultados de longo prazo

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

Encarada com ceticismo até bem pouco tempo atrás, a técnica de congelamento de óvulos foi aprimorada e se transformou em uma das estrelas dos congressos de reprodução humana neste ano. Doze países, inclusive o Brasil, estão adotando a procedimento (vitrificação) e 600 bebês já nasceram no mundo por meio dele- ao menos 25 no Brasil.
Desenvolvida por um grupo liderado pelo japonês Masashige Kawayoama, a vitrificação é um processo de congelamento ultra-rápido que, diferentemente do congelamento lento que é feito habitualmente, evita a formação de gelo no interior do óvulo (que pode destrui-lo no descongelamento).
O congelamento de espermatozóides e de embriões já é feito há muito tempo, mas o resultado com óvulos era desanimador. De cada dez submetidos ao congelamento, apenas um "sobrevivia" ao processo. Por essa razão, ele só era indicado a mulheres que iam se submeter a tratamentos do câncer, que podem destruir a fertilidade.
Segundo os especialistas, o "pulo do gato" da nova técnica é a rapidez no congelamento. Antes, a temperatura demorava entre 120 e 180 minutos para cair aos -196 C. Agora, o processo leva um segundo.
O preparo dos óvulos também é outro. Antes, eles recebiam uma dose pequena de substâncias para proteger suas estruturas internas. Na nova vitrificação, a concentração dessas substâncias é mais alta e invade o interior do óvulo para substituir a água ali contida.
Para o embriologista Peter Nagy, diretor de um serviço de biologia reprodutiva em Atlanta (EUA), o aperfeiçoamento da técnica de vitrificação foi "incrível". "Temos conseguido resultados [gravidezes] muito semelhantes aos dos obtidos com o uso de óvulos não-congelados", garante. Segundo ele, a técnica já permite que serviços ofereçam a "preservação da fertilidade" às mulheres com menos de 40 anos que pretendem adiar a maternidade.
O ginecologista Eduardo Mota, da clínica Huntington, é mais cauteloso. "É uma técnica que carece de resultados a longo prazo, mas parece ser a melhor forma de dar a mulheres que não tenham outra opção uma perspectiva de preservar a sua fertilidade. Desde que elas entendam os limites da chance de gestação por ciclo [de fertilização in vitro]." Na clínica, 15 bebês já nasceram por meio de óvulos congelados e outros cinco estão a caminho, diz Mota.
O urologista Edson Borges, da clínica Fertility, acredita que uma das vantagens da vitrificação de óvulos seja a possibilidade de armazenar óvulos doados por outras pacientes com objetivo de formar um "banco de óvulos" -a exemplo do que existe com esperma. O serviço já recebeu 12 doações.
Borges questiona a utilidade de as mulheres congelarem seus óvulos para uso futuro. "Como prever que uma jovem não vá querer conceber naturalmente sem a necessidade das técnicas de reprodução assistida?", questiona o médico.
Ele calcula que, para conseguir gerar um bebê com óvulos congelados, uma mulher teria de se submeter a pelo menos duas estimulações ovarianas para produzir de 20 a 30 óvulos. Depois é preciso considerar as taxas de fecundação, de implantação e de aborto espontâneo. "Tempos que pensar."
Outra questão apontada por Borges é a falta de estudos mostrando o tempo de viabilidade de preservação de óvulos vitrificados. "Por analogia com o congelamento de embriões, consideramos que os óvulos podem permanecer congelados por um período muito longo sem que ocorra nenhuma alteração em sua qualidade e viabilidade", argumenta Nagy.

Segurança
Até o momento, estudos mostram que a técnica é segura do ponto de vista de possíveis má-formações. "O índice de defeitos de nascença entre as crianças fruto de óvulos vitrificados é de 2,5%, porcentagem comparável ao de nascimentos naturais ou por fecundação in vitro", afirma Ri-Cheng Chian, da Universidade McGill, de Montreal (Canadá), autor de um recente estudo publicado na revista "Reproductive Biomedicine Online".


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