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Brasil testa transplante facial em roedor

Especialistas do Hospital das Clínicas de São Paulo realizaram primeiras cirurgias do tipo no país em dois ratos

Objetivo é entender melhor mecanismos de rejeição; país já tem cerca de 20 pessoas indicadas para cirurgia

Alessandro Shinoda/Folhapress
O cirurgião plástico Fábio Busnardo, 41, do HC de São Paulo; no detalhe, um dos ratos que receberam o transplante
O cirurgião plástico Fábio Busnardo, 41, do HC de São Paulo; no detalhe, um dos ratos que receberam o transplante

CLÁUDIA COLLUCCI
DE SÃO PAULO

O Hospital das Clínicas de São Paulo realizou os primeiros transplantes de face em animais. A cirurgia, inédita no país, é o primeiro passo para que seja feita em humanos. Dois ratos receberam os transplantes nas últimas semanas e se recuperam bem.

Ainda não há legislação que regulamente esse tipo de cirurgia em humanos no Brasil. No mundo, ao menos 20 intervenções já foram feitas desde 2005 -nos EUA, na França, na Espanha, na China e na Turquia.

De acordo com o projeto de pesquisa aprovado pela comissão de ética do HC, outros 38 ratos terão as faces transplantadas até dezembro.

A partir de 2013, começam as discussões sobre os critérios de inclusão (o perfil do paciente apto ao transplante) e outras formalidades para que o Ministério da Saúde aprove o procedimento.

Ao menos 20 brasileiros (dois deles atendidos no HC) têm indicação para receber um novo rosto.

Em geral, são pessoas que foram atacadas por animais, vítimas de tiros e descargas elétricas ou que têm malformações faciais.

Segundo o cirurgião plástico Fábio Busnardo, coordenador da pesquisa no HC, o objetivo da pesquisa com ratos é avaliar o melhor método de diagnóstico e de controle da rejeição.

Após transplantarem a face dos roedores, os pesquisadores diminuem as doses de imunossupressores para analisar a rejeição nos diferentes tecidos (pele, mucosa e osso).

"Compreendendo mais rapidamente onde ela começa, poderemos ajustar melhor as medicações", diz Busnardo.

Ele afirma que a técnica do transplante de face não se diferencia muito da usada nos reimplantes faciais (com tecido da própria pessoa).

"A forma como é feita a revascularização do tecido, com a sutura de veias e artérias e a reconstrução da musculatura facial, é a mesma."

Segundo ele, o que muda é a necessidade de compreender melhor os fenômenos da rejeição. "A gente vai trabalhar em conjunto com colegas que já atuam com transplantes de órgãos e que têm experiência com isso."

Dos 20 transplantados de face no mundo, dois morreram. Um deles, na França, morreu por infecção no local operado. O outro, chinês, porque decidiu parar de tomar os imunossupressores.

CANDIDATOS

Segundo Busnardo, os candidatos ao transplante facial são pessoas com defeitos complexos, que envolvem, além da pele, estrutura muscular (boca e pálpebras) e parte óssea (maxila).

"São defeitos que você não consegue reimplantar com tecidos de outras regiões. São pessoas que já fizeram 30, 40 cirurgias, e o resultado não fica bom", explica.

Uma das questões éticas desse tipo de transplante é o risco que o paciente corre com o uso de imunossupressores, drogas que, a médio e longo prazo, podem provocar o surgimento de diabetes, insuficiência renal e câncer.

Nos outros tipos de transplante (de coração, rim e fígado, por exemplo), esse debate não existe porque o paciente corre risco de morte iminente se não receber o novo órgão.

Um consenso das sociedades americanas de microcirurgia reconstrutiva e dos cirurgiões plásticos defende que a escolha deve ser deixada para os pacientes. Eles precisam ser devidamente informados dos riscos e passam por avaliação psicológica extensa sobre depressão e capacidade de decisão.

"Vamos olhar para a situação de alguém que perdeu o rosto. Eles são isolados. Eles não saem. Se você não tem um rosto, você não tem uma vida", disse à Folha Maria Siemionow, cirurgiã plástica na Cleveland Clinic, que realizou o primeiro transplante facial nos EUA em 2008.

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