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A cura pela rede

Diagnosticado com tumor no cérebro, artista italiano abre sua ficha médica na internet e dá impulso à ideia de uma terapia "colaborativa"

Divulgação
O artista e professor italiano Salvatore Iaconesi, 39
O artista e professor italiano Salvatore Iaconesi, 39

MARIANA VERSOLATO
DE SÃO PAULO

Um diagnóstico de câncer no cérebro, um site com todos os exames e dados clínicos, um convite para que as pessoas sugiram uma cura.

O resumo lembra um episódio de "House" no qual o médico da TV tem uma paciente que pede, em seu blog, opiniões sobre a terapia. Mas trata-se da iniciativa "La Mia Cura Open Source", do artista e professor de design digital Salvatore Iaconesi, 39.

No início de setembro, o italiano criou o site www.artisopensource.net/cure, no qual anunciou ter a doença e fez um chamamento.

"Este é um convite aberto para participar da cura. Há cura para o corpo, espírito, para a comunicação. Pegue as informações sobre a minha doença e me dê uma cura: crie um vídeo, um mapa, um texto, um poema, um jogo ou tente achar uma solução para o meu problema de saúde."

No mesmo dia em que lançou o site, dois médicos escreveram, comentando as imagens da ressonância magnética e outros exames disponíveis no site. Um mês depois, mais de 60 especialistas se manifestaram.

A iniciativa surgiu de um desejo de receber outras orientações sobre seu tratamento além das dos médicos que cuidam dele.

REVISÃO POR PARES

"Não me senti à vontade com um veredicto único e autoritário dos médicos. Ao compartilhar os dados, permiti uma abordagem mais científica, similar à revisão por pares, porque acesso um sistema de pessoas que discutem, comparam e indicam soluções", disse à Folha.

"No fim, separei as estratégias que poderiam ser úteis, incluindo cirurgia, estilo de vida e dicas de alimentação."

Em geral, pacientes vão ao médico em busca de informações, mas Iaconesi inverteu os papéis, e ele é que começou a levá-las aos médicos.

"Não é que eu diga: 'Oi, vocês não sabem nada sobre mim e a internet me disse que esse é o jeito de me curar'. O que faço é pedir para conversar e confrontar informações. Quando explico dessa forma, eles ficam interessados", diz.

Sua alimentação no hospital, por exemplo, foi reformulada a partir das sugestões.

OPEN SOURCE

Para disponibilizar os exames em seu site, o italiano precisou dar um jeitinho: "hackeou" e abriu os arquivos dos seus exames, entregues a ele em um CD.

Iaconesi diz que os dados estavam em um formato disponível só para profissionais e, por isso, só poderia mandá-los a outros médicos.

Isso fez com que ele começasse uma luta pela abertura do formato de dados médicos, o que levou quatro deputados do Partido Democrático italiano a pedir que o ministro da Saúde considere a entrega de fichas clínicas digitais abertas aos pacientes.

"A digitalização das informações de saúde é útil porque anula as distâncias e os tempos", afirmam os deputados em documento.

Rafael Schmerling, oncologista do Hospital São José (SP), afirma que os pacientes sempre recebem seus exames em CD ou em fotografias, mas não há interesse ou necessidade de manipular as imagens. "Ele criou uma nova demanda", afirma.

A história de Iaconesi fez ainda com que ele fosse convidado a se apresentar na rede de conferências TEDx Transmedia, em Roma.

Quanto às outras curas que ele pediu aos internautas, foram mais de 300 respostas em pouco mais de um mês, como cartas desejando melhoras e manifestações artísticas.

O artista Patrick Lychty criou uma réplica do tumor que pode ser impressa em 3D. O músico Vincenzo Scorza deveria se apresentar ontem, em Palermo, e utilizar as imagens do tumor em projeções.

E a dançarina brasileira Sheila Canevacci Ribeiro fez uma performance na PUC-SP em homenagem a Iaconesi.

"As respostas dão uma sensação boa porque há positividade. As pessoas constroem algo em vez de ficarem tristes", conta Iaconesi.

Veja galeria de fotos com as manifestações
folha.com.br/fg10692

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