São Paulo, domingo, 08 de junho de 2008

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ONDE

O quatrilho

por THIAGO NEY

A TRAJETÓRIA DOS QUATRO SÓCIOS RESPONSÁVEIS PELA EXPANSÃO DO STUDIO SP, CLUBE DE MÚSICA AO VIVO QUE AJUDOU A PAVIMENTAR O CAMINHO PARA BANDAS EMERGENTES EM SÃO PAULO

Esta é a história de um clube de música ao vivo que cresceu e se mudou. Saiu de uma casa na Vila Madalena e foi se esticar num galpão da rua Augusta. E esta é a história dos quatro amigos responsáveis pela transposição: um ex-assessor de ministro da Justiça; um chef francês que atuou como DJ embaixo do aeroporto de Frankfurt; um músico que abriu uma casa noturna para longos solos de guitarra; e um italiano que produziu a turnê européia dos Rolling Stones em 1982.

O Studio SP, cujo palco abrigou artistas tão díspares como os recifenses Del Rey e os cuiabanos Vanguart, deixou o casarão de nº 170 na rua Inácio Pereira da Rocha para se acomodar num galpão mais amplo, cuja arquitetura exibe um bem-vindo mezzanino e que abriga até 450 pessoas (no antigo endereço, 320 pessoas eram suficientes para transformar o ambiente numa 25 de Março em período de Natal).

Pequenas mesas ocupam o salão, que abre no início da noite, sem cobrança de ingresso, para shows de novos artistas. Uma arquibancada em linhas curvas, como as do acarpetado palco, remete a uma antiga casa que serviu de inspiração para o novo Studio SP. E aqui começa a história de Guga Stroeter.

Produtor cultural, ex-estudante do Equipe (colégio paulistano de Pinheiros cujas salas de aula foram responsáveis pelo encontro de integrantes dos Titãs) e músico que já acompanhou Caetano Veloso (fase "Fina Estampa") e Rita Lee ("Acústico"), Guga Stroeter, 47, fundou em 1987 a Orquestra Heart-breakers, espécie de big band que protagonizava bailes às quartas-feiras no Avenida Club.

Stroeter é músico tradicional, daqueles que valorizam o aspecto "ao vivo e autoral". "No início dos anos 90, muitas casas diziam aos artistas 'Não pode tocar música própria e os músicos não podem fazer solos longos'. Então decidi montar uma casa onde as bandas pudessem tocar música própria e fazer solos longos."

Esse espírito norteou o surgimento do Blen Blen, em 1994. Com uma programação diversificada, atraiu para a Vila Madalena sedentos fãs de bandas como Funk Como Le Gusta e Cordel do Fogo Encantado, além "do primeiro show dos Racionais fora da periferia de São Paulo", lembra Stroeter.

Mas, no início dos anos 2000, ele admite que "faltou gás" para a casa, que "perdeu o bonde da música eletrônica" e viu o público escassear. Em 2007, o Blen Blen fechou as portas, mas não sem antes motivar a abertura de um descendente assumido. E aqui começa a história de Maurizio Longobardi.

O que fez o italiano Maurizio Longobardi desembarcar no Brasil em 1990 não foi a música verde-e-amarela. Aos 28 anos, chegou de Milão para rodar o país co-filmando documentários (um deles: "O Brasil Grande e os Índios Gigantes", retrato da tribo Panará).

Como no Brasil grande documentarista não está entre as profissões mais rentáveis, Longobardi mudou de ramo. Seis anos depois de chegar ao país, tornou-se dono de casa noturna ao colocar em pé o Brancaleone, na mesma Inácio Pereira da Rocha que funcionava como endereço para o Blen Blen, de Stroeter.

Para tocar o local, que recebia DJs de black music, o recém-empresário da noite usou a experiência de ex-produtor de shows de rock na Itália. Experiência que o levou a conhecer os Stones -em 1982, Longobardi produziu uma turnê na qual seguiu a banda por 42 datas européias. "O segundo show foi em Nápoles. E, lá, não podia ser em outra cidade, metade dos 14 caminhões que transportavam materiais de merchandising sumiram..."

Ao mesmo tempo em que comandava o Brancaleone, organizou jams sessions no MIS e na Casa das Rosas, entre 1997 e 1999. As jams deram origem, em 1999, ao Grazie a Dio, outro palco na Vila Madalena que ainda abriga música ao vivo. Em 2003, conheceu Guga Stroeter, e aqui começa a história de Alexandre Youssef.

Alexandre Youssef é figura conhecida entre músicos e produtores culturais paulistanos.

Na gestão Marta Suplicy (2000-2004), liderava a Coordenadoria da Juventude da prefeitura. Com o auxílio de músicos e produtores, armou ações de diversas artes em diversos bairros da cidade.

Advogado formado pelo Mackenzie, Youssef, 33, foi professor de política contemporânea para alunos do segundo grau e, hoje, é sócio do Núcleo Idéias Movimento (responsável pelo site Overmundo e pela curadoria de eventos como o Campus Party Brasil). E trabalhou como assessor de José Carlos Dias no ministério da Justiça. Em Brasília, conheceu Marta Suplicy, que o convidou a participar da campanha à Prefeitura de São Paulo. Entre um projeto e outro à frente da Coordenadoria da Juventude, conheceu Stroeter e Longobardi.

Marta deixou a prefeitura, Youssef passou a assessorar Soninha na Câmara Municipal e, em 2004, este advogado que nunca exerceu a profissão procurou Stroeter e Longobardi com a idéia de abrir "um espaço para novos artistas, não só da música, mas das artes visuais".

Em novembro de 2005, fruto da união dos três, nascia o Studio SP. E aqui começa a história de Olivier Anquier.

A ligação de Olivier Anquier com casas noturnas é mais antiga do que o envolvimento profissional desse francês de 48 anos com pães e comida.

Em 1976, escudado por discos de rock e funk, Anquier se tornou DJ, "num clube chamado Kirt, na Champs-Elysées". Foi a St. Tropez contratado por um empresário alemão, que pouco depois o levou a Frankfurt para tocar no Dorian Gray, clube que funcionava "praticamente embaixo do aeroporto" . Após oito meses, voltou a Paris. Na capital francesa, freqüentou clubes que exaltavam a música e a excentricidade tupiniquim e por isso, em 1980, quando decidiu sair pela primeira vez da Europa, São Paulo foi seu destino.

Por nove anos ganhou dinheiro como modelo. Em 2000, abriu o bar Azucar, de inspiração cubana, no Itaim Bibi. Mas ia à Vila Madalena assistir a shows no Grazie a Dio, onde conheceu Longobardi. Em jantar recente, o italiano contou ao francês sobre a mudança do Studio. Anquier sugeriu equipar a casa com uma cozinha para servir "comidinhas conhecidas do Brasil". No clube da Augusta, estampa o cargo de "curador gastronômico" -até Anquier concorda que o nome soa... pomposo.

A missão do "curador gastronômico" não é criar pratos, mas replicar iguarias famosas, como o tacacá da dona Maria, de Belém, os pastéis de bacalhau do Mercado Municipal... E avisa que, como "consultor gastronômico", não irá atuar como DJ.

Aqui termina a história dos quatro amigos que comandam o novo Studio SP. Se em tempo curto a casa ajudou a fomentar a música ao vivo na Vila Madalena, qual a contribuição do espaço para a região da rua Augusta? O aumento do congestionamento? "Não", rebate Youssef. "O Studio abre mais cedo do que os outros clubes da região. Os problemas de trânsito no decorrer da noite não virão da gente."


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