São Paulo, domingo, 25 de Setembro de 2011

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FINO

BEAT ACELERADO

por Eduardo Logullo

O poeta e escritor Jorge Salomão, 65, está em ebulição. lança dois livros e aproveita para rever suas vivências pela era hippie. E resume sua ópera: "sou muitos em um"

MEU CORPO NO MUNDO

Sinto como se vivesse sempre num prólogo, num começo. Tudo é entrada para algo. Não gosto de pessoas que morrem em vida. O mundo é apenas para atuar. A Terra está tremendo. Tudo interessa. Se não, a vida se torna uma lata de refrigerante amassada. As pessoas hoje andam muito consumistas. Confundem vida com dinheiro. Eu prefiro rebolar para inventar novidades 24 horas. Espalhar provocações.

'ESTRADA DO PENSAMENTO'

Esse livro traz 160 páginas com superposições, radiografias, colagens, situações e personagens. Existe algo do ?escritor franco-argelino?Albert Camus [1913-1960] na estrutura da escrita, uma busca pelo enigma da vida, pelo discurso inatingível. Um libelo contra xaropadas e velhices.

'CONVERSA DE MOSQUITOS'

O segundo novo livro (175 páginas) trata de poesia e ?de filosofia. O título surgiu quando eu lia Wittgenstein ?[filósofo austríaco, 1889-1951]. De repente, vi dois mosquitos na janela que pareciam confabular. Fiquei em dúvida se seria uma projeção da leitura ou algo real. [Ambos os livros saem em outubro pela Editora Jacaré. Salomão é autor de outros cinco títulos]

ROUPA SUJA

Escrevo ainda um monólogo para teatro: "Uma Estrela Também Vai ao Tanque". São delírios criativos, ideias que despontam enquanto lavo louça ou roupas. De repente, "baixa" uma Maria e falo loucuras. No ritmo de uma pessoa que olha a pia, o tanque e as minúcias do cotidiano, num claro contraste entre vida prosaica e cibermundo.

O QUE VIER EU TRAÇO

E preparo outros dois livros: "Campo Minado de Flores" e "Panacum". E fiz a curadoria de "Vozes de Nelson Cavaquinho", mostra que começou a percorrer espaços culturais do Estado do Rio. Mas ando empolgado com o "Jorge Salomão Show", progama exibido no Cine ?Santa Teresa. E com as entrevistas semanais que faço na Rádio Roquette Pinto, aqui no Rio.

FUNDAMENTOS

Minhas histórias se revestem de elementos da era beat e da fase hippie. Hoje, o estilo daquele período influencia o rock, a moda europeia, a arquitetura sustentável, além de resgatar fanzines, "happenings" e atitudes escapistas. As campanhas de grandes lojas anunciam que o tom hippie está de volta. Sendo assim, posso ser considerado um fundamento do "flower power" nacional, por que não?

ARGUMENTOS

Estive próximo a grandes personagens: Miles Davis [trompetista americano, 1926-1991], John Cage [artista americano, 1912-1992]. Realizei parcerias com vários artistas e convivi com a grandeza tropicalista do meu irmão, o poeta Waly Salomão [1943-2003]. Fiz letras para 43 canções, fui citado em canções de Gilberto Gil ["Jeca Total", álbum "Refazenda", 1975] e Caetano ["O Divino Conteúdo", álbum "Temporada de Verão", 1973]. Por fim, ganhei, em 1987, o documentário "Jorgeando", dirigido por ?Malu de Martino sobre o meu zigue-zague cultural.

HÉLIO OITICICA

Morei em Nova York entre 1977 e 1978, auge da repressão militar. Não aguentava mais ser preso no Brasil. Queria ficar com Hélio Oiticica [1937-1980]. Lá fiz de tudo: entreguei caixas de tomate e pintei apartamentos. Helio andava bodeado da cultura norte-americana. Quando víamos Andy Warhol nas ruas, ele gritava: "Odeio essa barata descascada!". Convenci-o a voltar. Lembro-me da cena: muita neve, um táxi e Hélio com casaco de czar dando adeus. Quando chegou ao Rio, ligou animadíssimo. Ele retornava ao que amava: samba, rua, morro, Mangueira.

WALY SALOMÃO

A importância poética de meu irmão continua grandiosa. Decidi lançar no ano que vem um livro chamado "Duas ou Três Coisas que Eu Sei Dele" [ainda sem editora], numa citação do filme de Godard. Contarei vidas em comum que seguiram por becos diferentes. Desde a nossa saída de Jequié (BA), no início dos anos 1960, para estudarmos em Salvador. Coisas divertidas. Por exemplo: Sandra Gadelha [ex-mulher de Gilberto Gil] se lembra que nos viu dançando com Glauber Rocha, feito loucos, numa calçada no centro da cidade. Vai ser mano a mano.

TAMBORES ACESOS

Sou ateu, mas os santos gostam de mim. Não jogo isso fora. Sou devoto de são Jorge. Às vezes converso com ele como uma pessoa: "Você não está me ajudando". Faço meditações subversivas, exercendo a concentração de forças como postura. Descobri isso para viver melhor. Durmo pelado e em casa só ando nu. Eu medito pelado, com a minha essência. Sou um perigo.

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