São Paulo, domingo, 28 de Agosto de 2011

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FINA

15 minutos de sossego

por Fabrício Corsaletti

A estilista carioca Gilda Midani cria roupas com um estilo desleixado/chique, para mulheres que, como ela, estão a fim de conforto e aconchego

Quando as Torres Gêmeas do World Trade Center foram ao chão em 11 de setembro de 2001, a carioca Gilda Midani percebeu que seu relacionamento de seis anos com o dramaturgo Gerald Thomas, com quem vivia em Nova York, também havia chegado ao fim. Mudou-se para Los Angeles e, no quintal da casa que alugou, começou a confeccionar camisetas com impressões em látex. Sua vizinha, a atriz Uma Thurman, dava "pitacos" nos trabalhos. Era o início de uma carreira de estilista que Gilda, aos 41 anos, abraçava com a mesma coragem ("ou irresponsabilidade?", ela se pergunta) com que se jogou nas muitas aventuras de sua história caótica e fascinante. As camisetas foram vendidas num showroom em Paris, em 2004. Em 2006, ela lançou sua primeira coleção, aí não só de camisetas, no Brasil. Hoje, a marca Gilda Midani tem duas lojas, uma em São Paulo e outra no Rio. Suas peças, em sua maioria de algodão e de seda, com tingimentos artesanais, aos poucos conquistam um público sofisticado e sem frescura, menos interessado nas novas tendências do que numa roupa bonita e confortável. Sem pretensões de revolucionar a linguagem da moda, o que Gilda procura é dar cara própria a formas já existentes. Seu "casaco Chanel" feito de cobertor Parahyba é uma releitura do modelo clássico francês. Teve como inspiração os cobertores cinza com listras vermelhas dos mendigos brasileiros. "Tenho um lado marginal e acho que daria uma boa mendiga, se fosse necessário", exalta-se.

desejos imediatos
Gilda Barbosa da Silva (seu nome de batismo) nasceu no Rio de Janeiro, em 1960, numa família de aristocratas decadentes, e é a caçula de cinco irmãos. Órfã de mãe aos dez anos, levou (leva) uma vida zero convencional, guiada pela urgência do desejo e não por "planos de futuro" ou qualquer coisa do tipo. Assim, aos 17 anos, vele-java pelo mar do Brasil e do Caribe no barco de uns primos e, aos 19, seguindo os ventos da intuição e da oportunidade, veio morar em São Paulo, onde se tornou fotógrafa. Fez editoriais para as revistas "Vogue" e "Playboy" e é au-tora de capas de discos de Caetano Veloso e de Gil. Mais tarde, como produtora-executiva, trabalhou com os fotógrafos Ellen von Unverth, Nathaniel Goldberg e Steven Klein, entre outros. No final dos anos 1990, foi fi-gurinista de algumas peças do parceiro Gerald Thomas e das óperas "Tristão e Isolda", na Alemanha, e "Moses und Aaron", na Áustria.

ser mutante
Essa disponibilidade para encarar desafios artísticos é só uma das tantas maneiras com que ela se entrega ao desconhecido. Gilda é um ser mutante (de acordo com sua psicanalista nova-iorquina) e não tem medo de experimentar. Morou em várias cidades e, hoje, cigana com grana, mantém um apartamento em Paris e um em São Paulo, embora passe a maior parte do tempo no bairro da Gávea, no Rio, em sua casa ou no ateliê. Durante anos, tomou quase todas as drogas que cruzaram seu caminho. Maconha. Ácido. "Eu usava em situações banais, em qualquer lugar." Provou heroína. Cheirava pó. "Sou uma sobrevivente." Aí traga o cigarro e diz: "Já transcendi essa questão". Filhos, André Midani Gilda tem dois filhos: João Vicente de Castro, 28, do namoro com o jornalista Tarso de Castro -um dos fundadores de "O Pasquim"- e Ana de Souza Dantas, 20, filha de Tuca Moraes e, portanto, bisneta de Vinicius de Moraes. (João Vicente é casado com a atriz Cleo Pires). Foi Tarso de Castro, aliás, quem apresentou Gilda para o futuro marido, o produtor musical André Midani, 28 anos mais velho do que ela. O encontro aconteceu no Sambódromo do Rio, em pleno Carnaval, Gilda grávida do primeiro filho. Na ocasião, André, a fim de ajudar aquela "menina linda, com um sorriso estonteante" a subir em seu camarote, lhe estendeu a mão e, "sem mais nem menos" -como ele escreve em seu "Música, Ídolos e Poder"-, disse: "Um dia você vai ser minha mulher". Vinte e três anos depois, casaram.

"Tenho um lado marginal e acho que daria uma boa mendiga, se necessário"

à vontade
Com o pé descalço sobre a mesa, Gilda Midani parece no topo de sua trajetória. Como se tudo o que a trouxe até o presente, toda a quinquilharia inconciliável do passado, de repente se iluminasse, ganhasse sentido e lhe desse potência. "Sinto que agora tenho uma personalidade. Não é uma personalidade pré-fabricada. É algo que conquistei ao longo dos anos. Olhando para trás, entendo o que sou e fui", diz. Em relação à moda, por exemplo, explica que antes de ir para Los Angeles não pensava em virar estilista. Porém, afirma se lembrar do que vestia em cada um dos dias que guarda na memória e conta que, quando criança, nenhum presente lhe agradava tanto quanto uma roupa divertida. No mais, gosta de imaginar que sua atividade atual não se destina a pessoas em busca de 15 minutos de fama, mas, sim, de alguma tranquilidade.

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