São Paulo, Domingo, 29 de Abril de 2012

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QUADRINHOS

MENINO PRODÍGIO

por Adriana Küchler

Quadrinista Grampá vai ser o primeiro brasileiro a escrever e desenhar uma HQ do Batman e quer levar para a TV uma versão do pinheirinho estrelada por mulheres.

Um exército armado com antenas parabólicas como escudos, canos de PVC como caneleiras e capacetes de moto como armaduras impressionou o país em janeiro durante os conflitos pela reintegração de posse da área conhecida como Pinheirinho, em São José dos Campos (SP). E levou o quadrinista Rafael Grampá a um estado de choque.

“Olhei o Pinheirinho e falei: ‘Parece que fui eu que fiz isso aí’. Quando eu crio super-heróis, me aproprio de um monte de coisas da vida cotidiana, para fazer a história mais realista. Foi o que eles fizeram.”

Inspirado na realidade que parecia copiar suas fantasias, Grampá, um dos quadrinistas brasileiros mais badalados, vai se arriscar agora no cinema. Só que no seu Pinheirinho particular, um “minimanifesto político”, o terreno será um prédio, e a tropa, formada só por mulheres –com uniformes improvisados, mas femininos.

O desafio, ele diz, é traduzir o estilo de quadrinista para a linguagem do cinema. “E tirar o ranço que o Frank Miller (de “Sin City”, de 2005, e “The Spirit”, de 2008), aquele grandessíssimo fdp, deixou de que quadrinista não sabe dirigir.”

O audiovisual é a nova aventura do gaúcho de Cachoeirinha que vive em São Paulo e ganhou fama no mundo dos quadrinhos com sua primeira “graphic novel”, “Mesmo Delivery”, de 2008. Naquele ano, fez história ao se tornar o primeiro brasileiro a ganhar, junto com os gêmeos Fábio Moon e Gabriel Bá, o Prêmio Eisner, o “Oscar dos quadrinhos”.

Grampá, 34, topou entrar no projeto depois de anos de insistência do diretor Heitor Dhalia (“O Cheiro do Ralo”), da produtora Paranoid. “Ele me convenceu dizendo que a maioria dos diretores tem dificuldade em achar um estilo e que eu já tinha um, que eu era mais diretor que quadrinista.”

Grampá se inspira em filmes como o japonês “Old Boy” (2003) e “Drive” (2011) e nas obras do cineasta italiano Sergio Leone (1929-1989) para criar o projeto, uma série em formato “live action” (com cara de animação, mas feita com atores reais), que logo vai ser apresentada para canais de TV.

SANTA ORELHA, BATMAN!

A outra novidade na prancheta de Grampá é ainda mais importante para os fãs de quadrinhos. Ele vai ser o primeiro brasileiro a criar e a ilustrar uma HQ do Batman para a DC Comics. A história faz parte de um projeto maior e secreto da editora para 2013 e do qual outro brasileiro, Rafael Albuquerque, também faz parte.

O gaúcho terminou o roteiro do seu Bruce Wayne na semana passada, mas diz que vai “pra cadeia” se revelar detalhes do projeto. Conta apenas que seu Batman é “bem autoral” e que vai usar o Coringa como o arqui-inimigo da trama. “Tive uma sacada e mudei o visual do vilão.”

Desenhar o Batman para a DC é uma espécie de sonho realizado para quem, influenciado por Disney, Mauricio de Sousa e Daniel Azulay, começou a rabiscar o homem-morcego aos três anos de idade.

“Quando fiz o Batman pela primeira vez, minha mãe achou que era um burrinho, por causa das orelhas. Comecei a desenhar mais e melhor para fazer ela entender.” Até hoje, ele não sabe se a mãe entendeu. “Ela gosta é de recortar minhas entrevistas no jornal, gravar programas na TV.”

Grampá ainda se assusta com o sucesso repentino que o fez aparecer em programas e jornais, ser escalado para a Flip e descobrir via Twitter que uma americana tatuou um de seus desenhos no braço. “O sucesso é isso, o quanto ‘tu vai’ marcar a vida das pessoas. É o melhor elogio que se pode ter.”

Seus desenhos estão marcados em algumas pessoas, mas não há nenhum deles pendurado nas paredes verdes de sua casa, na Lapa. Alguns estão em quadros, mas largados no chão. “Tenho medo de colocar na parede e parecer que tenho um ego gigante. Tem quem ache que fiz sucesso muito rápido e que isso é prejudicial para os novos desenhistas. É difícil fazer amigos no meio”, bufa.

Uma conversa casual com o cantor Criolo, outro artista de sucesso instantâneo, acalmou a sua ansiedade. “Ele me disse: ‘É só fazer sucesso que as pessoas te odeiam. Relaxa’.”

Enquanto tenta relaxar, o artista acaba de criar uma banda de rock de brincadeira, a Old School Satan, e espera a hora de começar o roteiro da adaptação de “Mesmo Delivery” para o cinema. A história da viagem de caminhão de um ex-boxeador e um imitador de Elvis Presley vai ser dirigida por Mauro Lima (de “Meu Nome Não É Johnny”), que atualmente trabalha numa cinebiografia de Tim Maia.

Ex-evangélico e hoje um estudioso de física quântica (“Gosto de mistérios”), Grampá segue inventando projetos para aliviar a sina de criar HQs. “Quadrinho é uma coisa muito solitária e não condiz com a minha personalidade. Sou supersocial. História em quadrinho é a coisa mais difícil que eu faço porque depende só de mim.”


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