São Paulo, domingo, 29 de novembro de 2009

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SÉRGIO DÁVILA

A reunião-que-não-é-reunião de "Seinfeld"

por SÉRGIO DÁVILA, de Washington

"SEINFELD" E A VOLTA DOS QUE NÃO FORAM

Colunista assiste à tão aguardada reunião do elenco da série que revolucionou a TV

Em 1939, depois de ter encantado o mundo, o bailarino Vaslav Nijinsky enlouquecia num sanatório em Münsingen, na Alemanha, onde, perto de completar 50 anos, passava os dias catatônico. Sua mulher, Romola, insistia em deixar uma barra em seu quarto, esperando que ele se animasse a ensaiar. Num dia, reza a lenda, durante a visita de um fotógrafo e de um jovem bailarino que ele teria visto como ameaça, nos poucos segundos em que ninguém prestava atenção nele o russo se levantou e deu um último salto.

A foto é histórica e mostra um homem já gorducho, levitando como se a lei da gravidade tivesse sido revogada por um instante.
Foi essa a impressão –a do salto genial– que teve quem assistiu ao último episódio da mais recente temporada de "Curb Your Enthusiasm", que foi ao ar aqui nos EUA no domingo passado –o Brasil exibe amanhã, dia 30, o terceiro dos dez capítulos da série de TV, rebatizada de "Segura a Onda", na HBO Brasil. O autor e personagem principal, Larry David, diluiu a volta de "Seinfeld" (1989-1998) ao longo do arco narrativo de sua própria série, no que a atriz Julia Louis-Dreyfus, aElaine, batizou de "a reunião-que-não-é-reunião".

Os fãs tiveram de esperar os dez episódios para pegar segundos aqui e minutos ali e montar o quebra-cabeças do que seriam os preparativos para a gravação de um último episódio com o elenco original da melhor série de todos os tempos, que Larry David reuniu por motivo espúrio: reconquistar a ex-mulher, Cheryl (a atriz Cheryl Hines), a quem ele daria um papel secundário. Foi a série ("Seinfeld") dentro da série (a volta de "Seinfeld") dentro da série ("Curb...", em que o autor interpreta a si mesmo).

Num último suspiro de genialidade, foi possível ver trechos dos quatro amigos –Jerry (Jerry Seinfeld), George Costanza (Jason Alexander), Kramer (Michael Richards) e Elaine– como eles seriam 11 anos depois. ATENÇÃO: NÃO CONTINUE LENDO ESTE TEXTO SE NÃO QUISER SABER DETALHES AINDA INÉDITOS NO BRASIL. George inventou um aplicativo para o iPhone, o iToilet, que usa GPS para indicar onde estão os melhores banheiros de qualquer lugar do mundo.

Ganhou milhões, casou-se e perdeu tudo no esquema de Bernie Madoff. Seinfeld doou esperma para que Elaine tivesse uma filha, Isabel, que não aparece. Kramer continua Kramer, sem muita explicação, mas num dos episódios dos preparativos o ator Michael Richards se purga do incidente da vida real em que foi acusado de racismo, em 2006, ao xingar membros da plateia de um show que fazia em Los Angeles.

"Seinfeld" revolucionou –e eu não uso a palavra levianamente–a TV ao levar ao ar em horário nobre uma série aparentemente sobre o nada que era um tratado sofisticado, ainda que exagerado para efeitos cômicos, sobre o dia a dia da neurótica classe média urbana norte-americana. Acabou no auge, e todos se comprometeram a não cair na cilada dos ex-grandes, que é voltar para mais 15 minutos de fama e assim estragar o legado original.

Eles voltaram por alguns segundos, sem ter voltado de verdade, apenas para que os espectadores sentissem o gosto do que estariam perdendo se tudo não tivesse ocorrido como ocorreu. Uma segunda chance que reforça a qualidade da primeira. O que mais se pode pedir da arte?

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