São Paulo, domingo, 30 de janeiro de 2011

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15 MINUTOS

Sem vergonha

por VAVÁ RIBEIRO

O encontro de Washington Olivetto com o quase paulistano Ronaldo Nazário de Lima, eterno ídolo que detesta dar cabeçada

Serafina me convidou para entrevistar Ronaldo.

Entrevista feita no mês em que a cidade que se chama São Paulo - mas que devia se chamar Corinthians - completou mais um ano.

Ronaldo, que  me conhecia como publicitário profissional, me recebeu como jornalista amador, com paciência e elegância, no novo e espetacular centro de treinamento do Corinthians. Falou como o grande atleta que sempre foi e como o grande empresário que certamente será.

A entrevista se transformou num bate papo de amigos, daqueles que já viram quase tudo no futebol e  na vida.

Ronaldo, você é um sujeito entrevistado desde os 15 anos de idade, ou seja, tem quase 20 anos de entrevistas no mundo inteiro. Você, ainda hoje, tem paciência para dar entrevistas?  Eu carrego o peso de ser o que sou e a responsabilidade que isso me traz, não é? Então, eu uso as entrevistas para passar a mensagem que eu quero.

Seus filhos jogam futebol?  Jogam brincando, mas não são muito vidrados. O Ronald é corintiano, mas, na verdade, nunca foi muito ligado ao futebol. Ele acompanha os jogos, mas tem outras preferências. Videogame por exemplo. O meu filho mais novo, o Alex [cuja paternidade foi reconhecida por Ronaldo em dezembro de 2010], também torce para o Corinthians. 

Espontaneamente?  Já veio pronto, já.

 

E você, ficou Corinthians?  Eu sou corintiano roxo. 

Uma das coisas que mais me impressionaram foram dois gols de cabeça que você fez na mesma partida. Depois, com sinceridade, você falou: "Está acontecendo cada coisa aqui no Corinthians que eu não acredito".  Porque eu não faço gol de cabeça de jeito nenhum!

Você é ruim nas cabeçadas por falta de vocação ou de treino?  Quando eu era mais novo, com 16 ou 17 anos, já na Holanda, a gente fazia uns treinamentos de disputa de bola de cabeça e, numa dessas vezes, eu cortei o supercílio. Dali em diante, fiquei traumatizado de ter um confronto, assim, uma disputa de bola de cabeça. Então, ou eu cabeceio sozinho... ou prefiro usar minha cabeça para pensar. 

Hoje tem torcedor que se acha especialista até em medicina esportiva. Muita gente comentava, por exemplo, que todo o trabalho de fortalecimento que o Ronaldo fez quando foi para a Europa conduziu à possibilidade de contusões graves. O que poucos sabem é que, na verdade, no caso do futebol profissional, a noção do esporte como saúde não é verdade. Realmente, esporte é saudável, mas no esporte de alto nível, ou seja, no futebol profissional, essa história é completamente diferente, porque nós somos explorados e monitorados a cada dia, para dar o máximo do nosso corpo, para saber o limite que a gente pode dar. Então, o futebol de alto nível deixa de ser um esporte saudável. Coisa que causa lesões, causa problemas físicos. 

Quem foi o melhor cara tecnicamente com quem você já jogou?  Zidane.  Era especial jogar com ele. Era muita técnica aliada a uma elegância. Um estilo único de jogar com o pé, era muito bom.

 

E o seu melhor marcador? O Paolo Maldini. Eu joguei contra ele muitos anos. Foram cinco anos em que joguei na Inter e, depois, a gente se enfrentava também quando eu jogava no Real Madri. Além de alguns jogos pela seleção brasileira. Eram sempre confrontos duros.

E a relação São Paulo e Rio, como é que ficou? Você está virando paulista além de corintiano? Eu amo o Rio de Janeiro, mas minha vida está sendo tão maravilhosa em São Paulo que poucas vezes eu vou ao Rio. Não que eu deixarei de gostar do Rio de Janeiro, mas São Paulo está me surpreendendo a cada dia, e positivamente. 

Então você acha que vai ficar por aqui? Na sua cabeça é plano a longo prazo? É, eu acho que sim.

 

Você está montando uma empresa, a 9ine, que tem como principal foco o gerenciamento da carreira de jogadores de futebol. Você já se imaginou sentado em um escritório?  O escritório da minha empresa está ficando pronto agora em fevereiro, e neste ano irei poucas vezes para me adaptar, conhecer. Mas não sou muito homem de escritório, prefiro ficar na rua, em contato com as pessoas. Estou muito entusiasmado e já preparando meu pós-carreira. 

Um garoto desses como o Neymar, eu acho que você pode ser útil demais para ele. Ele tem potencial para fazer uma carreira, proporcionalmente, como a sua. Ah,  tem muito que ser feito no futebol. A preparação dos atletas, hoje, é inexistente nos clubes. Eles não estão preocupados em formar homens com futuro. A gente vai dar muita assessoria no sentido também de preparar a carreira dos atletas. Hoje em dia, a grande maioria dos jogadores, depois que termina de jogar futebol, começa a passar dificuldades. É muito complicado. Você vê o potencial que tem o Neymar... Trabalhar bem o Neymar é formar um homem para a vida toda, prepará-lo para encarar a Europa. 

Queria sua opinião sobre a negociação do Ronaldinho Gaúcho. Eu achei um pouco -bastante aliás- , confusa. O Assis [irmão e empresário de Ronaldinho Gaúcho] tentou blindar o Ronaldinho de tudo, mas chega uma hora em que o jogador tem que ter voz própria. Ele não demonstrou em nenhum  momento qual era a vontade dele realmente antes de fechar.

 

Uma curiosidade: você falou de preparar homens e tal. Dos caras fora do esporte que você teve a oportunidade de conhecer na vida, qual o sujeito que mais o impressionou?  Foram dois: o papa João Paulo 2º e o Nelson Mandela. Foram os dois que, ao encontrar, senti uma energia diferente. É coisa de arrepiar mesmo, que se me contassem, eu provavelmente não iria acreditar. 

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