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Análise

Pesquisa tem falhas, mas retrata bem a internet hoje

Desumanização já atinge não só a produção, mas também o consumo

A pesquisa revela a vivência de qualquer internauta, cada vez mais invadido também por robôs 'legítimos'

NELSON DE SÁ
ARTICULISTA DA FOLHA

No "press release" que divulgou sobre a pesquisa, a Incapsula destaca que "revela o que o Google Analytics não mostra: 51% do tráfego de seu site é invisível a você" e 31% têm objetivo malicioso. Portanto, compre o serviço da Incapsula, que identifica e mata esses robôs malvados.

Bruce Sterling, o autor ciberpunk, saltou sobre a imagem das "entidades não humanas". Mas admitiu que "essas estatísticas não são confiáveis" e, no caso, não refletem a internet toda e sim os sites monitorados pela empresa, que "coincidentemente oferece segurança...".

Mas a questão é que, além de ecoar os autores de ficção científica, que já exploravam o temor das máquinas antes de existir a web, a pesquisa revela a vivência de qualquer internauta, cada vez mais invadido também por robôs "legítimos" da Microsoft, da Apple ou do citado Google.

Eles respondem por 20% do tráfego não humano, diz a Incapsula, com a diferença de não serem maliciosos e coletarem dados para o bem. Também eles, porém, desumanizam: indivíduos têm seus dados tornados caricaturas digitais e vendidos por aí a empresas que exploram e reforçam as caricaturas.

No site do "Tec", Evgony Morozov, autor de "The Net Delusion", alertou que a verdadeira ameaça está num mundo em que ser anônimo já é quase impossível. "Um mundo que os anunciantes -e Google, Amazon e Facebook- mal podem esperar, mas no qual o pensamento crítico pode ser difícil de promover."

Ele falava da Narrative Science, start-up que nasceu na Universidade Northwestern há dois anos e estreou na "Forbes" há dois meses (leia abaixo). Faz reportagens financeiras "sem intervenção humana", a partir de balanços. E é lida por outros robôs, para projeções financeiras, ironiza Morozov.

Nem ele nem Peter Kafka, do site "AllThingsD", veem maior problema nesses repórteres robôs, que são só o estágio seguinte das "fazendas de conteúdo". Podem até ajudar, livrando repórteres do jornalismo já automático para o jornalismo crítico.

Em debate dias atrás em Washington, Bob Woodward e Carl Bernstein, do caso Watergate, questionaram se seria viável uma reportagem igual, agora. De um lado, pela visão corrente de que a web é fonte, quando "a verdade está nas fontes humanas". De outro, pela recepção, "mais aberta aos fatos reais do que hoje".

Não só a produção de conteúdo vem sendo desumanizada, seja ela de humanos ou máquinas, como também o próprio consumo, seja ele humano ou robô.

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