Análise

Cobertura da Apple, mais que acrítica, é torcida organizada

A "Fortune" já apelidou ironicamente de "screwgate", parafusogate. "Screw" tem outros significados, entre eles alguns palavrões e "estragar", que foi o que a Day4 fez com a "comunidade Apple" -sites que só cobrem a empresa, obsessivamente, quase como torcida organizada.

Até no Brasil o parafuso ecoou. Mas nem todos caíram. Dias atrás, o site AppleInsider, um dos maiores da comunidade nos EUA, ironizou quem havia ecoado o "parafuso assimétrico". Reproduziu a manchete do concorrente "Cult of Mac", sem citar pelo nome, e anotou com orgulho que "o AppleInsider se recusou a noticiar".

De sua parte, o "Cult of Mac" chegou perto de se desculpar, postando que "é uma lição para aqueles de nós que cobrem o espaço Mac". Mas tratou de transferir a culpa para a própria Apple, "uma empresa notoriamente secreta", fechada, que "nunca confirma ou nega rumores".

O argumento não isenta o site, mas remete, mais que ao silêncio, à manipulação da informação pela Apple. Que começou cedo, na célebre Mac Keynote de 1983 em que Steve Jobs foi aplaudido, entre gritinhos de histeria, por jornalistas que o saudavam como um guerrilheiro contra o "Grande Irmão", a IBM.

Desde então, como o "screwgate" reafirma agora, a cobertura acrítica vai muito além da "comunidade". O parafuso assimétrico ecoou em revista da editora Condé Nast e em site da Globo.com. Mas é também do jornalismo tradicional que vem esperança na direção oposta.

Em janeiro, o "New York Times" rompeu anos de prostração e relatou más condições de trabalho na Foxconn, que produz aparelhos da Apple na China. O novo presidente, Tim Cook, quis reagir, atacou o jornal, mas cedeu, elevando salários etc.

Antes de Cook, Jobs, dois anos atrás, reagia aos suicídios na Foxconn dizendo que "eles têm restaurantes, cinemas, piscinas: para uma fábrica, é bastante agradável". E que a taxa de suicídios era "inferior à média chinesa".